sábado, 30 de maio de 2015

Diferenças e Características da Fala e da Escrita:   diferentes níveis de formalidade, organização e variação.

(conteúdo 5)

           A Fala e a Escrita são duas modalidades de uso da língua que se utilizam do mesmo sistema linguístico, mas têm suas próprias peculiaridades. Isso não significa que uma é superior a outra.
           Conforme Koch, (1997), alguns autores a partir da década de 60 consideraram a dicotomia entre as modalidades FALA e ESCRITA, atribuindo a cada uma características particulares.  Koch afirma que tais características refletiam uma visão preconceituosa e centrada no modelo da escrita formal padrão. Veja as tabelas abaixo para maior entendimento sobre a FALA e a ESCRITA:

FALA
ESCRITA
Contextualizada
Descontextualizada
Implícita
Explícita
Redundante
Condensada
Não-planejada
Planejada
Predominância do “modus pragmático”
Predominância do “modus sintático”
Fragmentada
Não-fragmentada
Incompleta
Completa
Pouco elaborada
Elaborada
Pouca densidade informacional
Densidade informacional
Predominância de frases curtas, simples e coordenadas.
Predominância de frases complexas e subordinadas
Pequena freqüência de passivas
Emprego freqüente de passivas
Poucas nominalizações
Abundância em nominalizações
Menor densidade lexical
Maior densidade lexical

















         Em linhas gerais, é possível considerar que essas características não são exclusivas nem de uma nem de outra modalidade e que elas foram estabelecidas a partir dos parâmetros da escrita por visão preconceituosa que discriminava a fala. É mister entender que a fala possui características próprias:
1) não-planejável”. Ela precisa ser apenas “localmente planejável”.
2) ela é o seu próprio rascunho (não tem como passa-la a limpo, pois o que foi dito , não tem volta, apenas reparação.
3) Descontinuidades frequentes no fluxo discursivo,
4) Sintaxe característica ligada, de certa forma, à sintaxe geral da língua.
5) Fala é processo, portanto, é dinâmica.

           O texto falado não é caótico, ele tem uma estrutura própria que se pauta a partir de sua produção. É nesse sentido que deve ser descrito e avaliado. No processo de produção do texto falado, os interlocutores estão num mesmo tempo e espaço físico (salvo exceções como telefone, rádio e outras possibilidades de conversação oral à distância que a tecnologia oferece).

I. QUESTÃO DE REFERÊNCIA:
 na oralidade muitas vezes os referentes são recuperados no próprio contexto (basta apontar, por exemplo), dispensando assim que os falantes precisem explicitá-os sempre. Mas na escrita não é bem assim, pois por ser não-presencial há a necessidade de explicitar sempre os referentes, através das marcas lingüísticas.

II. REPETIÇÕES: no texto falado, a repetição é muito freqüente, aliás ela é um dos seus mecanismos de organização, desempenhando funções didáticas, sintáticas, argumentativas, enfáticas etc.

III. USO DE ORGANIZADORES TEXTUAIS: são continuadores tópicos da fala, por exemplo: e, aí, daí, então, daí então etc: Os textos das crianças são ricos em organizadores textuais típicos da oralidade.

IV. JUSTAPOSIÇÃO DE ENUNCIADOS SEM MARCA DE CONEXÃO EXPLÍCITA:
 é comum, nos textos, enunciados justapostos, sem elementos explícitos de conexão, ligação ou transição. O sujeito que está adquirindo a modalidade escrita, ainda não aprendeu os mecanismos sequenciadores próprios dessa modalidade e mistura à escrita o padrão oral. Exemplo: “Entraram na gruta com lanterna primeiro foi o leão muitos tigres e onças depois foi milhares de cobras.
 
V. DISCURSO CITADO:
 o discurso citado é manifestado prioritariamente no estilo direto que o mais freqüente na oralidade, em geral, sem a presença de um verbo que introduza a fala do outro (fulana disse:, fulana resmungou:, fulana gritou:). O sujeito ainda não aprendeu os mecanismos seqüenciadores próprios da modalidade escrita e mistura a ela a estrutura mais típica da oral que é a que ele melhor conhece.

VI. SEGMENTAÇÃO GRÁFICA:
 também é comum que a segmentação gráfica, em textos de sujeitos iniciantes na modalidade escrita, seja feita em função do que ele ouve. É curioso notar que a criança, por vezes, tentando acertar a segmentação gráfica adequada, acaba dividindo no meio algumas palavras ou juntando outras numa só!

VII. GRAFIA CORRESPONDENTE À PALAVRA:
 ou seqüência de palavras tal como pronunciadas oralmente, isto é, reproduzindo o que a criança ouve.

VIII. CORREÇÕES FEITAS DA FORMA COMO SE FAZEM NO TEXTO ORAL:
 assim como na fala, o sujeito não apaga ou risca a forma que considera inadequada, mas justapõe a esta a forma corrigida. 

I. Fala x escrita - a perspectiva das dicotomias:

FALA = contextual, implícita, redundante, não planejada, imprecisa, não normatizada.

ESCRITA = descontextualizada, explícita, condensada, planejada, precisa, normatizada.

           Para um resumo breve sobre LINGUAGEM ORAL e ESCRITA , o video abaixo é recomendado :


II. Oralidade x letramento ou fala x escrita:

ORALIDADE: prática social apresentada sob várias formas ou gêneros textuais em sua diversidade de uso formal e contextual.
                                               

FALA: forma de produção discursivo-textual oral que dispensa um aparato técnico, necessitando, apenas, dos recursos próprios ao ser humano.

LETRAMENTO: uso social da escrita que vai de uma apropriação mínima da escrita até uma utilização científica dela.


ESCRITA: tecnologia de representação abstrata da fala e produção discursivo-textual com especificidades próprias.


III. Oralidade e escrita no contexto das práticas sociais:  na civilização contemporânea Marcuchi considera a relação entre “vida cotidiana” e os fenômenos da fala e escrita. O texto seria, então, uma prática social e não um artefato linguístico.
          A escrita, enquanto prática social, tornar-se-ia indispensável. Em relação ao uso da língua (fala e escrita) as práticas sociais têm o seu lugar, papel e grau de relevância de ambas as modalidades na sociedade – eixo de um “continuum” sócio-histórico-tipológico e até morfológico.

Resumindo:

èHOMEM = naturalmente um “ser que fala” e não um “ser que escreve” – a escrita é derivada e a fala é primária.
èFALA = prática social do dia-a-dia.
èESCRITA = prática de um ambiente formal - escola (o que lhe confere prestígio).

          A escrita permeia hoje praticamente todas as práticas sociais das comunidades em que se insere sob a forma de “letramento”. Os objetivos e ênfase do uso da escrita variam de acordo com os contextos em que se inserem: a “apropriação / distribuição” da escrita e da leitura (padrões de alfabetização), e os “usos / papéis” da escrita e da leitura (processos de letramento). Mesmo as pessoas analfabetas também estão sob a influência das estratégias da escrita em seu desempenho oral.
             A escrita passou a ter um “status” bastante singular no contexto das atividades cognitivas em geral. Deve-se distinguir, então:

·LETRAMENTO: processo de aprendizagem sócio-histórica da leitura e da escrita em contextos informais e para usos utilitários.

·ALFABETIZAÇÃO: domínio ativo e sistemático das habilidades de ler e escrever.

·ESCOLARIZAÇÃO: prática formal e institucional de ensino que visa a uma formação do indivíduo, sendo que a alfabetização é apenas uma das atribuições/atividades. (cf MARCUSCHI, 2007a).

           Muitos são os usos de oralidade e escrita em nossa sociedade os diferentes usos possibilitados através de diferentes mídias e tecnologias, além da própria voz e do código escrito, põem em contato / interação / dialogismo diferentes subjetividades, em diferentes espaços sociais:

·homem/mulher                                      ·patrão/empregado
·pai/filho                                                  ·professor/aluno
·padre/fiel ( entre outros)
                                                                                  
           A história do uso da escrita e da alfabetização ocidental é descontínua e contraditória. A alfabetização instituída dá-se de preferência sob o controle do estado, orientando-se por seus objetivos. Assim a aquisição da escrita é um fenômeno “ideológizavel”. A fala é contínua no dia-a-dia e a oralidade tem lugar em seus diferentes contextos e usos sociais.
  
V. Fala x escrita – perspectiva variacionista: tal visão trata do papel da escrita a partir dos processos educacionais e da variação na relação língua padrão e não-padrão em contextos de ensino formal. Modelos teóricos baseiam-se no “currículo bidialetal”. Não há dicotomias, verificam-se as regularidades e variações:

*Língua padrão 
 *Variedade não-padrão
*Língua culta 
 *Língua coloquial
*Norma padrão 
 *Norma não-padrão

          Para Marcuschi fala e escrita não são dialetos, mas “modalidades” de uso de língua. Nesse sentido o aluno se tornaria “bimodal”.

VI. Oralidade x escrita – a perspectiva interacional: esta perspectiva trata das relações entre fala e escrita, considerando o “continuum” textual. É a visão interacionista, cujos fundamentos baseiam-se em:

·Relação dialógica no uso                                           ·Estratégias de linguagem
·Funções interacionistas                                             ·Envolvimento e situacionalidade
·Formulaicidade

VII. Concepção e funcionamento da língua – consequente relação fala / escrita: 
          A língua (seja oral ou escrita) reflete a organização da sociedadeuma vez que se relaciona com as “representações e as formações sociais”. Entretanto, a fala e a escrita representam formas de organização da mente através das próprias representações mentais. 

          ***Atividade para demonstrar aos alunos na prática as diferenças entre a Linguagem Falada e Escrita.

1- O professor escolherá um um texto com relatos de um acontecimento do dia-a-dia. Como por exemplo a história de um dia ruim que alguém teve;
2- Serão escolhidos três alunos para essa demonstração;
3- A professora lê a história inteira para o aluno "A", enquanto os alunos "B" e "C" esperam do lado de fora;
4- Depois o aluno "A" sem ajuda do texto contará a história para o aluno "B", que depois fará o mesmo com o aluno "C".
5- Ao fim da atividade , com o aluno "C" recontando o que lhe foi passado , os outros alunos que acompanharam as três formas diferentes de contar a história verão as diferenças entre a língua falada e a escrita .


REFERÊNCIAS:

KOCH, I. V.  O Texto e a Construção dos Sentidos. São Paulo, Contexto, 1997, p.61-64. 
MARCUSCHI, L. A. Oralidade e Escrita. Recife/UFPE, Mimeografado,1995.
Da fala para a escrita: atividades de retextualização. 7ed. São Paulo: Cortez, 2007

(Letícia M. Goulart)

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