sábado, 30 de maio de 2015

Leitura, oralidade e escrita: práticas linguísticas, sociais e pedagógicas (Conteúdo 7)



PROJETO PARA DESENVOLVER ORALIDADE E ESCRITA NA PRÉ-ESCOLA 



Trabalho faz com que as crianças expressem suas preferências e respeitem os colegas.

A comida favorita, a história mais legal, a música mais divertida. As crianças adoram trocar experiências e falar sobre as coisas que gostam de fazer. "Eu prefiro brincar de boneca", diz Camila Vieira de Souza, 5 anos, da Creche Aventura do Aprender, em Osasco, na Grande São Paulo. "Eu adoro jogar bola, contam alguns dos colegas dela. Eu gosto mais de pular corda", afirmam outros, mostrando que desde cedo são capazes de fazer escolhas e manifestar-se a respeito delas. Como esses temas rendem muito bate-papo na hora do parque ou da merenda, a organização não governamental Associação das Mulheres pela Educação - que presta consultoria pedagógica a algumas creches da cidade resolveu usá-los como base de um projeto didático.  O principal objetivo é desenvolver a linguagem", justifica Terezinha dos Santos, coordenadora de Educação e presidente da entidade. Durante a primeira fase, os educadores dedicam atenção à oralidade, fazendo a garotada se expressar e justificar suas opções. Numa segunda etapa, o foco é a escrita e o objetivo, a montagem de um livro coletivo com as predileções dos autores.  No decorrer do trabalho, outras metas importantes também são alcançadas. Falar sobre o que agrada e o que satisfaz ajuda na construção da identidade e favorece a criação de vínculos, pois muitos vão se identificar com o gosto do colega. Caso isso não aconteça e apareçam divergências durante as exposições, o resultado também é positivo: está criada a oportunidade de aprender a respeitar as diferenças e a diversidade de opiniões. Além disso, a variedade de citações amplia o repertório em relação a brinquedos, brincadeiras, livros, músicas etc. Por revelar muito sobre a personalidade e os gostos individuais, é interessante que o projeto seja proposto no início do ano para haver maior aproximação entre todos.  
Intervenção didática  Embora seja interessante deixar o grupo falar à vontade, cabe ao educador fazer interferências que incitem à participação, principalmente dos mais tímidos. A professora Luciane Teixeira, da Creche Aventura do Aprender, desenvolve a atividade atualmente na pré-escola. "Na hora do conto, quando alguém tem dificuldade de se expressar espontaneamente, eu pergunto por que aquela é a história preferida, o que é mais legal nela, de qual personagem mais gosta." Depois, ela procura confrontar as opiniões, questionando se os outros concordam ou não com aquele colega. Nessa fase, é fundamental usar a sensibilidade. "Quando dois falarem ao mesmo tempo, é preciso dizer 'Quando você fala, você não gosta de ser escutado?' Então vamos esperar o amigo terminar para que você possa falar depois?"", ensina Clélia Cortez, coordenadora pedagógica da Creche Central da Universidade de São Paulo, na capital paulista.   Como explica o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, entre 4 e 6 anos a garotada usa a língua para brincar, expressar desejos, opiniões, ideias, sentimentos ou fazer relatos de acontecimentos. E situações de interação como a proposta por Luciane contribuem para a construção do conhecimento sobre as regularidades da linguagem oral, como a repetição de palavras e o uso de algumas delas como apoio para o pensamento ("né", "então" etc.). As crianças dessa faixa etária empregam os recursos de que dispõem. Muitas vezes chegam a criar expressões e palavras visando a apropriar-se das convenções ("Minha lista de preferições é...", em vez de "preferências"). Um projeto como esse pode desencadear uma série de outras ações, com os mesmos princípios, para ser realizadas em outros momentos ou até mesmo fora da sala. Uma ideia, dada por Clélia, é a garotada escrever um bilhete para a merendeira com a lista das frutas prediletas, pedindo que faça, com elas, uma gostosa sobremesa. Outra sugestão é propor uma pesquisa sobre os animais mais citados - podem ser os dinossauros, sempre presentes no imaginário da garotada, ou então os bons e fiéis cãezinhos. "Com isso, o educador consegue que o pequeno se sinta acolhido e perceba a importância de sua opinião", ressalta Clélia. 
Tudo vai para o papel   Depois da ênfase nas atividades de oralidade, o trabalho começa a se concentrar na leitura e na escrita. Vale lembrar que na pré-escola às crianças estão no processo de alfabetização e escrevem de acordo com suas hipóteses sobre o funcionamento do sistema de escrita. Mais uma vez as intervenções do professor são essenciais. "Para ajudar as crianças a avançar nos registros escritos, é preciso conhecer as diferentes fases do aprendizado da alfabetização", recomenda
Beatriz Gouveia, coordenadora do programa Além das Letras, do Instituto Avisa Lá, em São Paulo. Segundo ela, antes de tudo se deve fazer dessas atividades momentos de reflexão sobre a língua escrita. Para que isso ocorra, uma das principais intervenções é pedir que cada um leia o próprio registro. Luciane Teixeira ajuda a turma a avançar na escrita distribuindo, logo no começo do ano, crachás para todos. Mais do que facilitar o entrosamento, nesse projeto a identificação tem por objetivo estimular a comparação entre as grafias dos nomes. As crianças observam que o "bru" de "bruxa" que está no título do livro de contos preferido da turma é igual ao de "Bruno" e que o "ma" de "maçã" - a fruta mais gostosa, segundo boa parte da turma - está também no nome de Maria.   Uma página por autor  O ponto alto dessa etapa é a elaboração do produto final, o livro. Luciane costuma dar uma folha para cada um preencher com os itens que prefere. Depois de escrever e revisar, a turma toda se envolve na decisão sobre o título da obra, o visual da capa e a ordem das páginas. Antes de colaborar na montagem final, cada um escreve o nome completo e faz uma ilustração. A professora propõe o desenho do autorretrato por achar que ele ajuda ainda mais a personalizar a produção. Nessa fase, ela apresenta obras desse gênero de autoria de pintores famosos, que serão analisadas pelos pequenos e servirão de referência nas produções artísticas. Para enriquecer os momentos de criação, solicita que todos levem de casa uma foto recente. Uma outra opção é oferecer um espelho para que a garotada se observe antes dos primeiros traços. Luciane também deixa à disposição material de pintura, como giz de cera e lápis de cor.  Na opinião de Beatriz Gouveia, esse projeto é uma excelente opção para incluir a garotada nas práticas de linguagem, incentivando a compreensão de sua função comunicativa e da leitura e da escrita convencionais. A possibilidade de trabalhar com as listas é outra vantagem. Os pequenos aprendem a estrutura do gênero e que a organização das palavras, dentro de um contexto, adquire um sentido. Palavras como "carro", "doce" e "bola" são aparentemente desconexas. Mas, organizadas em uma lista das preferências, passam a ter um campo semântico definido e uma função comunicativa. Beatriz também elogia a ideia da criação de um livro. "Essa iniciativa convida a assumir o papel de leitor e escritor." O terceiro trunfo é trabalhar questões de interação. Afinal, é por meio das relações sociais que a criança se insere no mundo da linguagem e tem acesso a outras realidades. "O projeto abre a possibilidade de expor ideias, trabalhar em grupo, respeitar a opinião do outro e entender as diferenças", opina Clélia Cortez. 

CONFIRA ALGUNS EXEMPLOS DE PROJETOS DIÁTICOS:  

PROJETO- LINGUAGEM ORAL E ESCRITA Objetivos  - Desenvolver a comunicação oral por meio da exposição de idéias. - Ampliar os conhecimentos sobre o sistema de escrita, trocando experiências e discutindo a grafia das palavras. - Aprender a organizar uma lista. - Realizar atividades em grupo, compartilhar decisões e respeitar opiniões. 
Conteúdos  - Oralidade.  - Leitura e escrita.  - Respeito aos colegas e à diversidade de opiniões.  
Tempo estimado Seis atividades  
Materiais necessários   Cartolina, folhas de papel sulfite, papel-cartão, canetas, coloridas, brinquedos diversos, giz de cera e crachás.   Desenvolvimento das atividades  

1ª etapa  Comece o projeto com uma roda de conversa, estimulando todos a contar a você e aos colegas o que mais gostam de fazer ou de comer. A maioria vai querer falar sobre isso, e provavelmente de forma desorganizada. É hora então de apresentar o projeto, sugerindo a confecção de um produto a ser feito
coletivamente: o livro das preferências. Explique que cada um terá uma página contendo as informações sobre o brinquedo mais querido, a comida mais gostosa, a música favorita e assim por diante. Para decidir os itens que serão contemplados, converse com a classe e coloque as sugestões no quadro. A lista pode incluir filmes, brincadeiras, personagens etc. Escolhidos os tópicos, peça que cada um fale sobre os temas. Vá anotando as citações em uma cartolina, com letras grandes e legíveis. Uma boa maneira de estimular o discurso é fazer perguntas: qual é seu personagem preferido? De que brinquedo você mais gosta? Dada a resposta, peça justificativas. Incentive os colegas a comentar, socializando as opiniões (Você pensa a mesma coisa que seu colega? Por quê? Qual é sua opinião?). Para a conversa ficar mais animada, sugira que todos levem de casa os objetos mencionados para compartilhá-los com a turma. Reserve uma atividade para essa troca de experiências. 

2ª etapa Monte a lista em uma folha de sulfite com os tópicos a ser respondidos brinquedo, fruta etc. Faça cópias e distribua as páginas. Leia os temas em voz alta para não haver dúvidas e proponha a elaboração oral da listagem antes do registro. Em seguida, organize duplas de trabalho para a produção escrita e deixe as crianças usarem as próprias concepções. Uma vai ajudar a outra, mas é preciso intervir para levá-las a refletir sobre a maneira de grafar as palavras. O melhor modo de proceder é perguntar por que optaram por determinada letra e fazê-las utilizar o que já conhecem, comparando as sílabas usadas com as vistas em outros contextos. Peça que leiam o próprio registro. Assim é possível observar a ausência de uma letra ou a necessidade de alterar algumas delas.  

3ª etapa  Antes de partir para a confecção do livro, leve algumas obras infantis para a classe, como as de contos, para que a organização das páginas seja observada. Chame atenção para a numeração e o índice. 
Produto final  Livro  Para a publicação ficar bem acabada, é recomendável que a lista seja passada a limpo e que as páginas contenham ilustrações e o nome um fazer o próprio retrato. Delegue completo do autor. Uma idéia é cada algumas decisões à turma, como o título, o visual e as cores da capa e das páginas. Realize intervenções para ajudar na organização da publicação, ensinando a numerar as páginas e a fazer o índice. Como haverá apenas um exemplar, deixe-o disponível para o grupo consultar nos momentos livres e, posteriormente, organize um rodízio para que todos o levem para casa e leiam com os familiares.  
Avaliação  Observe se as crianças conseguem se expressar oralmente e como interagem com os colegas quando eles estão fazendo a exposição. Observe se avançaram em relação à escrita: a primeira lista certamente será feita com sua ajuda. Mas na preparação da versão final você pode conferir os avanços em relação aos procedimentos de escritor e ao conhecimento sobre a confecção de um livro.  

PROJETO - FEIRA DO LIVRO Objetivos  
• Formar comunidade de leitores. 
• Estimular a formação de leitores e escritores desde a Educação Infantil.  
• Investir na produção e no compartilhamento de resenhas.  
Tempo estimado  Dois meses.  
Materiais necessários  Um bom acervo literário, bem ilustrado e com vocabulário rico.  
Organização da sala  Nos momentos de leitura, coloque as crianças em roda. Na hora da escrita, faça agrupamentos de quatro.  
Desenvolvimento  • 1ª ETAPA 
Selecione os títulos adequados , com tramas interessantes e evitando os que têm vocabulário infantilizado. Apresente catálogos de editoras de obras infantis. Compartilhe algumas resenhas com a classe e converse sobre elas. Mesmo com o texto curto, é possível saber do que ele trata? Ele conta toda a história?  
• 2ª ETAPA Proponha fazer uma feira de livros, na qual todos terão de indicar alguns para que os visitantes se interessem e leiam. Ensine a diferença entre ler e contar. Para que as crianças se familiarizem com a linguagem escrita, leia sem acrescentar nem omitir nada. Na hora de contar uma história, mostre como a linguagem é mais coloquial e que detalhes são desnecessários no relato. Decida com a garotada os títulos favoritos para fazer as resenhas e como eles serão divulgados: em forma de painel, folder ou varal.   • 3ª ETAPA Para fazer as resenhas, os pequenos precisam conhecer os livros e gostar deles. Divida a turma em grupos, colocando pelo menos um participante mais experiente para ser o escriba. Peça que todos ditem o que querem comunicar. Essa será a base do trabalho. Lembre-os de que não se trata de reconto e questione a melhor forma de escrever para deixar as pessoas com vontade de ler.  
• 4ª ETAPA  Faça uma revisão coletiva de todos os textos produzidos. Chame a atenção para a repetição de palavras e para as marcas da oralidade (como aí, né e daí). Apresente as referências dos catálogos para comparação. Depois de revisadas, as produções devem ser passadas a limpo e ilustradas.  
Produto final  • Feira do livro Monte as mesas com as publicações e decida com a turma a ordem de quem falará. É interessante que todos participem, por isso faça o rodízio. 
Avaliação   Observe o envolvimento do grupo e veja se os textos apresentam as características próprias do gênero trabalhado.                         



FONTE: 
Disponível em <http://revistaescola.abril.com.br/educacao-infantil/gestao/linguagem-oral-escrita-428161.shtml>. Acesso em 09/04/2013. 
Disponível em <http://revistaescola.abril.com.br/educacao-infantil/gestao/feira-livro-428191.shtml>. Acesso em 09/04/2013. 

Disponível em <http://revistaescola.abril.com.br/lingua-portuguesa/alfabetizacao-inicial/eu-prefiro-boneca423396.shtml>. Acesso em 09/04/2013



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