Teorias
do texto
Conteúdo
2: O nascimento de uma Linguística do Texto: da frase ao texto - as três fases
de construção da Linguística Textual.
É de suma importância pensar
a estrutura do texto como uma unidade de análise linguística. Por mais que
pareça óbvio entender o texto como unidade de análise linguística e por mais
que se faça evidente a necessidade de estudá-lo em sua estrutura e construção, desvendando
o seu processamento, organização, modalidades e gêneros, é bom lembramos de que
isso nem sempre foi um consenso e que tais ideias nem sempre foram aceitas.
O campo
científico, Linguística Textual, nasce de um intenso esforço teórico que
defende que, toda a Linguística é uma Linguística de Texto. Opõe-se ao campo da teoria estrutural, que teve seu
período e reconhecimento ao final do século XIX até metade do XX.
Devido
seu sucesso, a Linguística Estrutural acabou chamando a atenção de outros olhares
teóricos também relacionados à linguagem para além do formalismo estruturalista
(história, antropologia, sociologia, etnometodologia, psicologia etc) e cresceu
ainda mais a necessidade de ampliar seus domínios, bem como o interesse em
sanar possíveis lacunas e insuficiências dessa ciência piloto, afinal uma
ciência nunca está fechada, pronta e acabada! A partir da década de 60,
surgem rupturas na fronteira com o Estruturalismo linguístico e dissidências se
fazem, constituindo novos campos teóricos da linguística, na maioria deles em
franca ruptura com algumas das ideias do estruturalismo linguístico, por
exemplo: a sociolinguística, etnolinguística, psicolingüística,
neurolinguística, pragmática, análise da conversação, análise do discurso, semântica, gramática
gerativo-transformacional e especialmente aqui a Linguística Textual, entre outros campos.
A seguir,
estão presentes os principais problemas e insuficiências deixadas pela
Linguística Estrutural:
·
Dicotomia Língua x
Fala (e desconsideração da Fala)
·
Desconsideração
dos aspectos Extralinguísticos
·
Autonomia do
objeto de estudo (Língua)
·
Desconsideração do
Sujeito (desconsideração da Fala, portanto, do Falante)
·
Unidade de análise
centralizada na Frase
·
Separação do
Enunciado de sua Enunciação
·
Pouco caso
relegado ao estudo da Significação e do Sentido entre outras questões de igual
modo importantes.
Na busca por alcançar os objetivos acima, em sua
constituição, a LT passou por três fases de desenvolvimento. Não houve um desenvolvimento exatamente homogêneo
dessas três fases. Os estudos acerca do texto desenvolveram-se e ampliaram-se
em diferentes países dentro e fora da Europa (destaque-se a produção
norte-americana, germânica e anglo-saxão), mais ou menos à mesma época e com
preocupações teóricas variadas. Assim, é importante perceber que não houve
precisamente uma sucessão cronológica na transposição de uma fase à outra. O
que melhor caracteriza a mudança de uma fase para a outra é muito mais a
ampliação e aprofundamento gradual dos estudos da LT, marcando cada vez mais
fortemente o seu afastamento em relação à Linguística Estrutural. Estas três
fases da LT costumam ser conhecidas como:
1a.
Fase Transfrástica: Vai além dos limites da frase. Esta fase
volta-se para os fenômenos linguísticos que nunca foram bem explicados pelas
teorias formalistas limitadas ao nível da frase.
2a.
Fase da Gramática Textual: Essa fase apoiou-se no objetivo de criar
gramáticas textuais. Mesmo considerando-se já um bom desenvolvimento nas
investigações da LT, acreditava-se ser o texto um sistema uniforme, estável e
abstrato
3a.
Fase da Teoria do Texto: “Investigar
a constituição, o funcionamento, a produção e a compreensão dos textos em uso [adquirindo] particular importância ...
[o] seu contexto pragmático [ou seja,] o conjunto de condições externas da
produção, recepção e interpretação dos textos.” (BENTES, op.cit., p.251).
O conceito de Texto também
evoluiu. Observem-se as características principais que constituem as concepções
de texto predominantes em cada fase.
I. Em um primeiro
momento (Fase Transfrástica), o texto é concebido como:
·
“uma sequência
pronominal ininterrupta” (dada a ênfase na questão da co-referenciação)
·
“uma sequência
coerente de enunciados”
·
“forma de
organização do material linguístico”
·
“unidade
linguística superior à frase”
II. Em um segundo
momento (Fase da Gramática Textual), o texto é concebido como:
·
“complexo de
proposições sintático-semânticas” (apresenta um conjunto de conteúdos)
·
“estrutura pronta
e acabada” que obedece a uma estrutura formal articulada estritamente a partir
de sete fatores de textualidade: Coesão, Coerência, Aceitabilidade, Informatividade,
Situacionalidade, Intertextualidade e Intencionalidade.
·
“produto de uma
competência linguística idealizada” (ênfase no aspecto formal do texto –
extensão e constituintes)
·
“maior unidade
linguística com sequência coerente e consistente de signos linguísticos.”
III.
Em um terceiro momento (Fase da Teoria do Texto),
a noção de texto é completamente revista. A Teoria do Texto não considera a
possibilidade do “não texto”, primeiramente por ser ilógico conceber uma
sequência linguística incoerente em si. Se há uma sequência linguística,
certamente há uma lógica.
Vejam-se três definições de texto de diferentes
autores:
Bakhtin
(1929) – “Na realidade, toda palavra
comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo fato de que procede de
alguém, como pelo fato de que se dirige para alguém. Ela constitui justamente o
produto da interação do locutor e do ouvinte. Toda palavra serve de expressão a
um em relação ao outro. Através da palavra, defino-me em relação ao outro, isto
é, em última análise, em relação à coletividade. A palavra é uma espécie de
ponte lançada entre mim e os outros. Se ela se apoia sobre mim numa
extremidade, na outra se apoia sobre o meu interlocutor. A palavra é o
território comum do locutor e do interlocutor”.
Koch
(1997a) – “Poder-se-ia, assim,
conceituar o texto, como uma manifestação verbal constituída de elementos
linguísticos selecionados e ordenados pelos falantes durante a atividade
verbal, de modo a permitir aos parceiros, na interação, não apenas a depreensão
de conteúdos semânticos, em decorrência da ativação de processos e estratégias
de ordem cognitiva, como também a interação (ou atuação) de acordo com práticas
socioculturais”.
Marcuschi
(1983) – “Proponho que se veja a Linguística do Texto, mesmo que provisória
e genericamente, como o estudo das operações linguísticas e cognitivas
reguladoras e controladoras da produção, construção, funcionamento e recepção de
textos escritos ou orais. Seu tema abrange a coesão superficial ao nível dos
constituintes linguísticos, a coerência conceitual ao nível semântico e
cognitivo e o sistema de pressuposições e implicações ao nível pragmático da
produção do sentido no plano das ações e intenções. Em suma, a Linguística
Textual trata o texto como um ato de comunicação unificado num complexo
universo de ações humanas. Por um lado, deve preservar a organização linear que
é o tratamento estritamente linguístico, abordado no aspecto da coesão e, por
outro lado, deve considerar a organização reticulada ou tentacular, não linear:
portanto, dos níveis do sentido e intenções que realizam a coerência no aspecto
semântico e funções pragmáticas”.
Conteúdo
3- Construindo
sentidos no texto: organização estrutural e processamento textual
Algumas
das principais categorias teóricas de análise relacionadas à organização
estrutural, às estratégias de processamento e funcionamento e ao contexto
interacional. Essa descrição será topicalizada das seguintes maneiras:
Processamento textual – o texto deve sempre
ser entendido como um processo. O processamento textual acontece através de
sistemas de conhecimento acionados no texto e no contexto de produção. Na
produção textual, toda ação (fazer) é necessariamente acompanhada de processos
de ordem cognitiva, de maneira que o sujeito dispõe de modelos e tipos de
operações mentais. Os interlocutores, na comunicação, dispõem de saberes
acumulados sobre os diversos tipos de atividades da vida social, eles têm
conhecimentos na memória que precisam ser ativados para que a atividade seja
efetivada com sucesso. Tais atividades geram expectativas e isso compõe um
projeto nas atividades de compreensão e produção do texto.Três grandes sistemas
de conhecimento, responsáveis pelo processamento textual: A) Conhecimento
linguístico. B) Conhecimento enciclopédico ou de mundo. C) Conhecimento
interacional.
Organização estrutural
– de modo geral, alguns autores, como por exemplo, Dijk (2000), Koch (1997a),
Fávero (1995) e Kleiman (2004), orientam uma organização textual a partir de
três níveis estruturais, inter-relacionáveis entre si: Superestrutural (ou de
nível global, com ênfase nas relações esquemático-cognitivas), Macroestrutural
(ou de nível semântico nas relações de coerência textual) e Microestrutural (ou
de nível de superfície linguística, com ênfase nas relações de coesão textual).
Quanto ao nível
SUPERESTRUTURAL, este se refere tanto às estruturas textuais globais que
permitem o reconhecimento dos gêneros ou tipos (ver exemplos abaixo),
como também envolve o conhecimento sobre estratégias esquemáticas cognitivas
relacionadas à significação global da base textual. São estratégias
facilitadoras na produção/recepção de textos que acionam na memória o
conhecimento armazenado, através de modelos globais como, esquemas, frames
scripts e planos.
Quanto
ao nível SUPERESTRUTURAL, este se refere tanto às estruturas textuais globais
que permitem o reconhecimento dos gêneros ou tipos (ver exemplos
abaixo), como também envolve o conhecimento sobre estratégias esquemáticas
cognitivas relacionadas à significação global da base textual. São estratégias
facilitadoras na produção/recepção de textos que acionam na memória o
conhecimento armazenado, através de modelos globais como, esquemas, frames
scripts e planos. A coerência textual é considerada
fundamental para a textualidade, pois dela depende em grande parte o sentido do
texto. A construção da coerência textual depende da organização tentacular de
fatores de diversas ordens: linguísticos, cognitivos, socioculturais,
interacionais e pragmáticos.
Quanto ao nível MICROESTRUTURAL, este se refere às relações coesivas
lineares que dizem respeito ao modo como os elementos presentes na superfície
textual estão interconectados. Diferentemente da coerência, a coesão diz
respeito à estrutura formal do texto. Trata da manifestação lingüística da
coerência e apresenta-se na forma como conceitos e relações subjacentes são
expressos no texto. A coesão é construída através de mecanismos gramaticais
(pronomes anafóricos, catafóricos, artigos, elipse, concordância, correlação
entre os tempos verbais, conjunções, etc.), que definem as relações entre
frases e seqüência de frases e no interior das mesmas, e lexicais,
através da reiteração, da substituição e da associação.
Conteúdo Complementar 4:
1
Outras teorias cujo objeto de estudo é o texto
Como é sabido, além da Linguística Textual, também houve outros lugares
de ruptura com o estruturalismo linguístico o que culminou na gênese de novos
campos de investigação. Assim, como a LT, muitos desses campos também
apresentam o texto (e não a frase) como objeto de estudo. Muitos
desses campos também apresentam o texto (e não a frase) como objeto de estudo.
Nesse sentido, serão apresentados aqueles campos mais representativos.
I. SOCIOLINGUÍSTICA
Esta área investiga a relação entre linguagem e sociedade, através dos
textos e postula o princípio da diversidade linguística. Nesse sentido, já é
fácil notar o seu perfil interdisciplinar. Ela inscreve-se na corrente das
orientações teóricas contextuais e funcionais sobre o fenômeno linguístico não
apenas sob o ângulo das regras de linguagem, mas também sob a perspectiva das
relações de poder manifestadas na e pela linguagem.
Seu interesse está em relacionar as variações linguísticas observáveis
em uma comunidade às diferenciações existentes na estrutura social desta mesma
sociedade, pois o objeto da Sociolinguística é a diversidade linguística. Nesse
sentido, é possível identificar certos fatores socialmente definidos,
relacionados à diversidade linguística como:
É possível identificar certos fatores
socialmente definidos, relacionados à diversidade linguística como:
¨Identidade social do
emissor ou falante.
¨Identidade social do
receptor ou ouvinte.
¨O contexto social
(estilos formal e informal).
¨O julgamento
linguístico-social distinto que os falantes fazem de si e dos outros.
É importante salientar ainda que a Sociolinguística diz respeito
prioritariamente ao estudo da língua falada, observada, descrita e analisada em
seu contexto social, isto é, em situações reais de uso. Seu ponto de partida é
a comunidade linguística. Ela se interessa pelas pesquisas voltadas, por
exemplo, para as minorias linguísticas e para a questão do insucesso escolar de
crianças oriundas de grupos sociais desfavorecidos.
Para a Sociolinguística a língua é um fato social, um sistema
convencional adquirido pelos indivíduos no convívio social, de onde se podem
abstrair as múltiplas variações observáveis da fala:
¨Uma língua varia em relação a outra ou
outras línguas, ou seja, as línguas variam entre si.
¨Uma mesma língua falada em países
diferentes varia de um país para outro onde seja falada.
¨A língua falada em um país varia de
região para região neste país.
¨A língua falada em um país varia de
comunidade de fala para comunidade de fala neste país.
¨A língua falada em um país varia em
diversos aspectos: étnico, etário, social, sexual, econômico, profissional,
cultural etc.
¨A língua varia até em um mesmo
indivíduo em relação aos seus diferentes níveis de formalidade e situações
linguísticas.
¨A língua pode variar em diferentes
níveis (Lexical, Morfológico, Sintático, Fonético e Semântico).
II. PRAGMÁTICA
A Pragmática analisa, de um lado, o uso concreto da linguagem, com
vistas em seus usuários, na prática linguística e, de outro lado, estuda as
condições que governam essa prática. Ela pode ser apontada como a
ciência do uso linguístico, cuja preocupação é antes com a Linguagem que
com a Língua. Nesse sentido, também se afasta dos pressupostos
estruturalistas (de F. Saussure).
A Pragmática defende a não centralidade da língua em relação à fala.
Esta área aposta nos estudos da linguagem, considerando a Fala e
não observa a Língua isolada de sua produção social. Os
estudos pragmáticos pretendem definir o que é linguagem e analisá-la (através
de textos) trazendo para a definição os conceitos de ‘sociedade’ e de ‘comunicação’,
descartados pela Linguística saussureana na subtração da fala (e do falante).
O recorte de análise da Pragmática não está reduzido a fatos delimitados
e convencionais da língua como sistema (inato), mas sim, trabalha a partir de
indícios de funcionamento da linguagem, mesmo que isso implique em
visualizar erro, exceção, licença poética!
Podem ser apontadas como as principais correntes pragmaticistas as
seguintes:
O Pragmatismo Americano é
|
Foi desenvolvido por W. James & Morris sob forte influência dos
estudos semiológicos de Charles Peirce, enfatiza a inclusão do sujeito na
construção do sentido e desconstrói a noção clássica de Verdade.
|
Os Estudos dos Atos de Fala é
|
São influenciados pela Filosofia da Linguagem (Wittgenstein) e
alavancados por Jonh L. Austin, enfatizam a performatividade da linguagem,
cuja definição estaria diretamente relacionada à ação e interação. É grande a
ênfase nas categorias de enunciados constativos e performativos; nos atos
loucionais, ilocucionais e perlocucionais; e nas regras conversacionais que
regem o princípio da cooperação na linguagem.
|
Os Estudos da Comunicação é
|
Integram ambos os interesses teóricos anteriores, mas acrescentam
ainda o interesse pelas questões sociais e históricas em que priorizam as
relações sociais, de classe, de gênero, de raça e de cultura.
|
Das três vertentes supracitadas, a que tem maior repercussão
historicamente é a Teoria dos Atos de Fala. Então,
aprofundando os estudos dos atos de fala, é importante destacar alguns tópicos,
conforme sintetiza Pinto, 2007:
- A
discussão sobre a “teoria dos atos de fala” foi aberta para debater como
as construções gramaticais podem levar a confusões lógicas entre
filósofos. Nesse contexto, J. Austin foi quem melhor se destacou na
exposição dos problemas, discutindo a materialidade e historicidade das
palavras.
“Seus estudos procuraram refletir sobre a possibilidade de uma teoria
que explicasse questões, exclamações e sentenças que expressam comandos,
desejos e concessões. A Teoria dos Atos de Fala, que tem por base conferências
de Austin publicadas postumamente em 1962 sob o título How to do things
with Word (Austin, 1990), concebe a linguagem como uma atividade
construída pelos/as interlocutores/as, ou seja, é impossível discutir linguagem
sem considerar o ato de estar falando em si – a linguagem não é assim descrição
do mundo, mas ação”. (PINTO, op.cit.:57).
- Inicialmente,
na Teoria dos Atos de Fala, um dos pares conceituais mais importantes é a
distinção entre os enunciados:
·Performativos – que realizam ações porque são ditos – “Eu
vos declaro marido e mulher em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo”.
·Constativos – que realizam apenas uma afirmação,
constatação – “A mosca caiu na sopa”.
A análise dos contrastes entre esses tipos de enunciados, o performativo
e o constativo, levou Austin a prosseguir no raciocínio e aventar a separação
de níveis de ação linguística através de enunciados. (cf. PINTO, op.cit, 58).
Esses níveis de ação agem simultaneamente no enunciado e Austin os denomina:
·Atos Locucionários – os que dizem alguma coisa – “Eu vou estar
em casa hoje”: tem a ver com o conjunto de sons que se organizam para efetivar
um significado referencial e predicativo, pois efetiva uma sentença sobre o eu.
·Atos Ilocucionários – os que refletem a posição do locutor
em relação ao que ele diz – “Eu vou estar em casa hoje”: é a força que o
enunciado produz que se tipifica em pergunta, afirmação, promessa, ameaça,
ordem, pedido etc.
·atos Perlocucionários – os que produzem certos efeitos
e consequências sobre o interlocutor, sobre o próprio locutor ou sobre outras
pessoas – “Eu vou estar em casa hoje”: é o efeito produzido na pessoa que ouve
o enunciado, por exemplo, sendo efeito de agrado, de medo, de ameaça,
transformando-se em ação.
- Os
atos de fala podem trazer ambiguidades em suas interpretações, pois um
enunciado pode tanto ser entendido como uma ordem, como uma ameaça ou como
um pedido – “A porta está aberta”. Assim, é importante considerar sempre o
contexto, a situação de fala entre os falantes em questão e mesmo assim os
limites da análise linguística muitas vezes não encontram muita
exatidão... Austin dedicou-se principalmente aos verbos performativos
prometer, declarar, batizar, casar, ordenar, pedir etc, causando grande
furor inicialmente frente à impossibilidade, atestada por ele próprio, de
manter a distinção entre os valores de verdade falsidade para esses
enunciados (atacando assim os semanticistas formais, lógicos).
- Questionado
em 1958 por um filósofo que dizia que o enunciado performativo poderia sim
ser verdadeiro ou falso, Austin respondeu com ironia:
“Pode-se dizer que um ato é útil, que é conveniente, que ele é mesmo
sensato, mas não se pode dizer que ele seja true or false. Qualquer que seja
ele, tudo que posso dizer é que os enunciados desse tipo são muito mais
numerosos e variados do que se acreditava”. (AUSTIN Apud PINTO, op.cit.:59).
Nesse famoso debate, para insistir na impossibilidade dos enunciados
performativos serem considerados verdadeiros ou falsos, Austin ousadamente
destitui a própria noção de constatividade que ele mesmo havia postulado antes
e mostra que enunciados aparentemente constativos são de fato performativos,
como “Eu te digo para fechar a porta” ou “A mosca caiu na sopa”. Ele inclusive
declara a insustentabilidade de enunciados constativos, afirmando que o
constativo nada mais é do que um performativo mascarado.
- Em
1981, com sua obra Speech acts, John Searle se dedica a interpretar,
reorganizar e dar um acabamento à obra de Austin, firmando a Teoria dos
Atos de Fala como importante corrente da Lingüística. Outros autores como
Derrida e Ducrot também se dedicaram a ler e problematizar a obra de Austin,
apontando para outras faces de análise da linguagem que não estivessem
presas necessariamente à experiência empírica e seus níveis de ação,
valorizando aspectos mais históricos, ideológicos, estruturais e
argumentativos.
III. ANÁLISE DO DISCURSO
A Análise do Discurso francesa (doravante AD) surgiu na França, nos anos
60 para suprir as insuficiências da análise de conteúdo das ciências humanas,
que concebia o texto em sua transparência, como projeção da realidade no mundo
(extradiscursivo) sem considerar as ligações linguísticas e textuais. A AD, ao
contrário, considera o texto em sua opacidade, enfatizando o funcionamento
linguístico-textual dos discursos no contexto histórico-social. Conforme
Maingueneau, 1987, subjazem à Análise do Discurso três práticas:
1. Tradição filológica – história e reflexão sobre os textos
(instrumento para História, antropologia, filosofia).
2. Prática da explicação de textos – teoria da leitura (contexto
universitário na França).
3. Base no estruturalismo que via o texto em sua imanência
diferenciado dos modos de estudo da filologia.
A linguística de Saussure era insuficiente por não dar conta da
linguagem linguisticamente, incorporando a sua “exterioridade”, sua condição
social, histórica e ideológica. Pêcheux concebe a AD apoiando-se criticamente
em Saussure, mesmo que reconhecendo nele o ponto de origem da ciência
linguística – Fonologia, Morfologia, Sintaxe. Mas afirma que, o estruturalismo
saussureano não dá conta da Semântica discursiva e suas condições sócio-históricas.
O quadro epistemológico do nascimento da AD é marcado pela presença do
materialismo histórico, da linguística, como processos sintáxicos e de
enunciação, e da teoria do discurso como teoria dos processos semânticos. A
esse quadro deve-se acrescentar, ainda, o apoio teórico buscado no seio da
psicanálise freudiana, através de Lacan. A AD tenta mostrar a inconsistência
dos textos no trabalho ideológico como ‘ilusão’, desmistificando esse
processo.
Além da influência de Althusser há também a influência de Foucault na
AD. Foucault concebia o discurso como dispositivo enunciativo e institucional
de diferentes práticas discursivas.
[ATENÇÃO]
Hoje não se
pode falar em uma escola de análise do discurso francesa, mas em várias. Houve
um deslocamento do discurso político para qualquer tipo de produção verbal. A
AD passou a fazer fronteira interdisciplinar com outras disciplinas:
sociolinguística, etnolinguística, análise conversacional, teorias da
argumentação, da comunicação etc. Há uma proliferação do emprego da expressão
“análise do discurso” o que pode causar uma certa confusão.
O objetivo da AD é apreender a linguagem enquanto discurso,
materializando o contato entre o linguístico e o não-linguístico. O que
interessa é construir o ‘olhar-leitor’ – a ação estratégica do sujeito.
A AD relaciona-se com textos produzidos em determinadas Formações
Discursivas:
·no quadro de instituições que
restringem fortemente a enunciação;
·nos quais se cristalizam conflitos
históricos, sociais, etc;
·que delimitam um espaço próprio no
exterior de um interdiscurso limitado.
O domínio da AD, mesmo “restrito” desta forma, permanece ilimitado –
discurso jurídico, religioso, etc., ou discurso narrativo, didático..., ou
ainda, imprensa socialista, manifestos feministas... questões que atravessam
essa ou aquela coletividade em dada conjuntura. Daí se constata a possibilidade
de construção de uma infinidade de objetos de análise.
Sobre a relação do objeto com os mecanismos de análise, todos os
fenômenos linguísticos a priori são passíveis de investigação
pela AD.
“Frente a um corpus, o pesquisador a priori não tem nenhuma razão
determinante para estudar um fenômeno em detrimento de outro, da mesma forma
que nada o obriga a recorrer a um determinado procedimento ao invés de a
qualquer outro. Se, para atingir seu propósito, ele se interessa, por exemplo,
pelos adjetivos avaliativos, por metáforas ou por algumas estruturas
sintáticas, isto ocorre unicamente em virtude de hipóteses... É o fato de levar
em conta a singularidade do objeto, a complexidade dos fatos discursivos e a
incidência dos métodos de análise que permite produzir os estudos mais
interessantes.” (MAINGUENEAU, op cit, p.18-19).
O analista deve esquematizar as referências linguísticas em que se
baseia e esclarecer ao leitor que pretende aprofundar tais questões nos textos
que deseja analisar.
A partir da crítica feita à dicotomia saussureana língua e fala, o
conceito de discurso se firma na associação de regularidades linguísticas às
suas condições de produção, constituindo o falante em sujeito assujeitado.
Atualmente os estudos discursivos concebem o discurso, de modo geral,
como a prática social de produção de textos. Todo discurso é um
construto social, não individual e analisável apenas a partir de suas
determinações sociais históricas e ideológicas.
A Análise do Discurso (de linha francesa) é uma prática e uma área da
Linguística e da Comunicação que se particulariza por analisar formações
ideológicas através de textos. É muito utilizada para a análise de
textospolêmicos, relacionados aos contextos político, pedagógico, religioso,
jurídico, científico, midiático e também artístico, de protesto, ou ainda
que evidencie minorias marginalizadas, em busca das ideologias que trazem em si.
Sua orientação teórica prioriza o estudo da estrutura e acontecimento
discursivos em seus processos formadores, bem como a determinação social
histórica e ideológica do/no discurso. (Cf. Indursky, 2006).
Saiba mais:
Algumas das
categorias teóricas da Análise do Discurso mais importantes são:
É Ideologia e Condições de Produção do
Discurso.
É Formações Discursivas, Formações
Ideológicas e Formações Imaginárias.
É Intertextualidade,
Interdiscursividade e Intradiscursividade.
É Paráfrase, Polissemia e Efeitos
de Sentido.
É Dialogismo, Polifonia e
Intertextualidade.
É Subjetividade e identidade: sujeitos
e sentidos.
Obs.: O estudo das valorações discursivas desvela os processos de
formações ideológicas, de formações discursivas e de interdiscursividades que
se entremeiam na produção dos sentidos e na constituição dos sujeitos. Observar
os aspectos teórico-metodológicos do Discurso como: os efeitos de leitura, de
autoria e de sentido, as noções de dialogismo e polifonia na linguagem, a
questão da argumentação e do uso da língua, constituem uma importante
ferramenta para um conhecimento mais amplo e articulado da linguagem.
IV. SEMIÓTICA DISCURSIVA
A Semiótica aponta o texto, e não a palavra ou a frase, como seu objeto
de estudo e procura explicar os sentidos do texto a partir de certos mecanismos
e procedimentos de construção do sentido. (Cf. Indursky, 2006). Esses
mecanismos e procedimentos dizem respeito a:
É a organização
linguístico-discursiva.
É as relações com a
sociedade e com a história.
O texto pode ser tanto um texto linguístico quanto um texto visual,
olfativo ou gestual, ou, ainda, um texto em que se sincretizam diferentes
expressões, como nos quadrinho, nos filmes ou nas canções populares. Esta
teoria interessa-se pela análise do Plano de Conteúdo do texto
e busca construir a sua significação a partir de Percurso Gerativo dos
Sentidos.
Este Percurso Gerativo dos Sentidos possui três grandes níveis de
análise: o Nível Fundamental; o Nível Narrativo; e o Nível Discursivo.
PERCURSO GERATIVO DOS SENTIDOS
|
Nível Fundamental
|
é o nível mais abstrato e simples. Os sentidos são entendidos pelas
categorias de oposição semântica. Os termos são determinados por ‘relações
sensoriais’ e considerados atraentes ou repulsivos, tensos ou relaxados,
negados ou afirmados através das categorias ou determinações Tensivo-Fóricas.
|
Nível Narrativo
|
é o nível em que se introduz o sujeito. Nele ocorrem transformações
narrativas operadas pelo sujeito. As categorias semânticas fundamentais
tornam-se valores dos sujeitos e são ‘inseridas’ nos objetos com que o
sujeito se relaciona. As determinações tensivo-fóricas convertem-se em
modalizações que modificam as ações e os modos de existência do sujeito e
suas relações com os valores.
|
Nível Discursivo
|
é o nível em que a narrativa é colocada no tempo, no espaço junto de
seus sujeitos, objetos, destinadores e destinatários. Os personagens do texto
tornam-se atores do discurso, graças a investimentos semânticos e de pessoa,
os valores dos objetos vão ser disseminados como temas e transformados
sensorialmente. Essas transformações produzem efeitos de sentido e fabricam a
ilusão da verdade.
|
V. ESTUDOS ENUNCIATIVOS
Partindo do princípio de que a produção de sentidos na linguagem não se
verifica em relação ao estado de coisas, mas se realiza a partir das
enunciações anteriores e no acontecimento enunciativo, faremos algumas
observações sobre o fenômeno da enunciação. Para isso, observaremos algumas
reflexões bakhtinianas sobre a enunciação e polifonia, as considerações de
Benveniste sobre a enunciação, os dispositivos teóricos concernentes à teoria
polifônica ducrotiana, além de considerações a respeito da Semântica Enunciativa
do Acontecimento de E. Guimarães.
Bakhtin legou-nos uma
importante trilha de reflexões a respeito da polifonia e da enunciação,
defendendo o dialogismo constitutivo da linguagem e a natureza social da
enunciação. Para ele, a enunciação é o produto da interação dos indivíduos
socialmente organizados e, ainda que não haja um interlocutor real, este pode
ser substituído pelo representante médio do grupo social ao qual pertence o
locutor. O termo “diálogo” deve ser entendido num sentido amplo, não apenas
como a comunicação em voz alta, de pessoas colocadas face a face, mas como toda
comunicação verbal, de qualquer tipo que seja. “A palavra é uma espécie de
ponte lançada entre mim e os outros” e em todo enunciado descobriremos que está
o outro em diferentes graus de alteridade. Existe uma gama dos gêneros mais
difundidos na vida cotidiana, tão cristalizados, apresentando formas tão
padronizadas (por exemplo, os provérbios), que a expressão individual do
locutor praticamente só pode manifestar-se na própria escolha do gênero. As
palavras não são de ninguém, estão a serviço de qualquer locutor e de qualquer
juízo de valor, e podem mesmo ser totalmente diferentes, até mesmo contrárias.
Conforme Bakhtin, em relação às fórmulas estereotipadas da vida corrente, os
sistemas ideológicos constituídos da moral social, da ciência, da arte e da
religião cristalizam-se a partir da ideologia do cotidiano, exercem por sua vez
sobre esta, em retorno, uma forte influência e dão assim normalmente o tom a
essa ideologia.
E. Benveniste afirma que a
enunciação coloca em funcionamento a língua por um ato individual de
utilização, por parte de um locutor que mobiliza a língua por sua conta: é o
ato mesmo de produzir um enunciado. A enunciação se caracteriza pela realização
vocal da língua, supõe a conversão individual da língua em discurso (a
semantização da língua) e apresenta caracteres formais próprios a partir da
manifestação individual que ela atualiza. Tal mobilização e apropriação da
língua são, para o locutor, a obrigatoriedade de referir pelo discurso e para o
outro: “a referência é parte integrante da enunciação”. A emergência dos
índices de pessoa (EU/TU) só se produz por meio da enunciação. Como diz o
autor, o presente é propriamente a origem do tempo. A enunciação cria entidades
na rede de indivíduos em relação ao “aqui-agora” do locutor. Em relação à
estrutura do diálogo na enunciação, o autor defende a possibilidade de haver
enunciado sem diálogo (portanto sem locutor):
“Poder-se-ia objetar que pode haver diálogo fora da enunciação, ou
enunciado sem diálogo. Os dois casos devem ser examinados. Na disputa verbal
praticada por diferentes povos e da qual uma variedade típica é o hain-teny dos
Merinas, não se trata na verdade nem de diálogo nem de enunciação. Nenhum do
dois parceiros se enuncia: tudo consiste em provérbios citados e em provérbios
opostos citados em réplica. Não há uma única referência ao objeto do debate.
Aquele, dos dois participantes, que dispõe do maior estoque de provérbios, ou
que os emprega de modo mais hábil, mais malicioso, menos previsível deixa o
outro sem saber o que responder e é proclamado vencedor. Este jogo não tem
senão a aparência de um diálogo. Inversamente, o “monólogo” procede claramente
da enunciação. Ele deve ser classificado, não obstante a aparência, como uma
variedade do diálogo, estrutura fundamental. O “monólogo” é um diálogo
interiorizado, formulado em “linguagem interior”, entre um eu locutor e um eu
ouvinte”. (BENVENISTE, 1989, p.87).
Ducrot desenvolve mais
sistematicamente a Teoria Polifônica da Enunciação, sendo este passo
significativo no sentido de romper com a unicidade do sujeito falante. Ele
conduz uma reflexão crítica sobre a postura tradicional de algumas linhas
teóricas da Linguística que concebem a linguagem como monológica e o sujeito
como unicentrado. Conforme Ducrot (1987), sua teoria polifônica da linguagem
desconstrói o postulado teórico acerca do sujeito unicentrado. Ele estabelece a
distinção entre os conceitos de FRASE (objeto teórico) e ENUNCIADO (fato empírico
observável no mundo). A descrição do conceito de ENUNCIAÇÂO tem três acepções:
·Enunciação – Atividade
·Enunciação – Produto
·Enunciação – Acontecimento
É com a última concepção (mais completa) que o autor se coaduna em sua
teoria. Dentro dessa perspectiva, conforme o autor, sobre os conceitos de
sentido e significado, o sentido diz respeito à enunciação e o significado diz
respeito à frase. Na enunciação, o sentido tem natureza instrucional a partir
das ‘Variáveis Argumentativas’. A concepção polifônica do sentido mostra como o
enunciado assinala, em sua enunciação a superposição de diferentes vozes. Para
Ducrot, tal qual uma cena de teatro em que se configuram diferentes personagens
que dialogam entre si, há uma apresentação de diferentes vozes, de vários
pontos de vista, e o locutor tem como função provocar seu aparecimento e
mostrá-los dentro do enunciado: a estes diferentes pontos de vista o autor vai
chamar de enunciadores. Ducrot (1988) aponta três diferentes funções
enunciativas para melhor identificar a multiplicidade de vozes presentes na
enunciação:
·O Sujeito Empírico – (SE): que é o autor efetivo, agente da
reprodução de discursos já escutados ou lidos. O ser empírico que preenche o
lugar de sujeito;
·O Locutor – L: que é o responsável presumido pelo enunciado
a quem se atribui a responsabilidade pelo mesmo, responsável, inclusive pelo
ato praticado e não pelo conteúdo proposicional. (marcas em primeira pessoa);
·O Locutor – Lp: que é o
locutor-enquanto-pessoa-no-mundo, aquele que serve de suporte para determinadas
predicações;
·Os Enunciadores – E1, E2 ...: que são os vários pontos de vista
que podem ser percebidos em um mesmo enunciado.
Apagada a mediação do sujeito empírico na enunciação, as figuras
enunciativas (SE, L, E1, E2...) dão lugar à multiplicidade de sujeitos.
Guimarães Assim como
Ducrot, esse autor distancia-se da visão de Benveniste que concebe a enunciação
como uma atividade do locutor em produzir um enunciado e que considera o
sujeito da enunciação como uno, único e onipotente em relação ao seu próprio
dizer e à língua da qual esse sujeito se apropria para dizer algo. Ele mantém
que no enunciado há a representação de diferentes papéis do Locutor. “as
personagens se constroem na medida em que se representa uma diante da outra”.
(cf. GUIMARÃES, 2002 p.21). O autor explicita que a dupla falante/ouvinte
apenas caracteriza os agentes físico-fisiológicos de falar e ouvir, de modo que
não dizem respeito ao linguístico e, portanto, não se incluem como objeto da
semântica. Entretanto as figuras/personagens da enunciação linguisticamente
consideradas são: locutor/alocutário e enunciador/destinatário. O locutor é
aquele que se representa com eu na enunciação, representando-se, internamente
ao discurso, como responsável pela enunciação em que ocorre o enunciado. O
locutor é uma figura constituída internamente ao discurso e marcada no texto
pelas formas do paradigma do EU. O alocutário é o TU do discurso, representado
enquanto correlato do locutor pelo próprio locutor. Na representação do locutor
podemos distinguir dois papéis, L e Lp. O Locutor-L é aquele que simplesmente
se representa como fonte do dizer. O Locutor-Lp é o Locutor-enquanto-pessoa-no-mundo.
O locutor-enquanto-pessoa-no-mundo deve ser caracterizado sócio-historicamente
e isso já se constitui num deslocamento que o autor faz em relação a Ducrot,
para quem o Lp é apenas mais uma figura representativa das funções enunciativas
que ele descreve. Respectivamente ao Locutor-L há o Alocutário-AL e ao
Locutor-enquanto-pessoa-no-mundo há o Alocutário-enquanto-pessoa (ALp). (Cf.
GUIMARÃES, op.cit., p.22). Há ainda o nível da relação entre enunciador e
destinatário para fechar o quadro polifônico da enunciação. O enunciador é a
posição do sujeito que estabelece a perspectiva da enunciação. O destinatário é
o correlato constituído segundo a perspectiva do enunciador. Suponhamos aqui
que no meio de uma conversa alguém diga: “Água mole em pedra dura tanto bate
até que fura”. Em tal enunciado representa um L que fala da perspectiva do
senso comum, e que, inclusive, mobiliza esta perspectiva como argumento para o
que diz. Assim L, neste caso, fala de uma perspectiva genérica-coletiva, e esta
enunciação representa um enunciador genérico-coletivo. Ao contrário de
Benveniste, Guimarães não exclui o enunciado proverbial do funcionamento
enunciativo, nem dialógico, nem muito menos lhe sonega o Locutor. Guimarães
procura caracterizar uma cena enunciativa no texto que cruza as representações
da enunciação (L, Lp, E) e como estas representações relacionam-se com as de
alocutário e destinatário representando a alteridade na enunciação. As
categorias de análise mencionadas pelo autor são inspiradas, na teoria
polifônica da enunciação de Ducrot, mas ele enfatiza seu afastamento quanto ao
apego à posição estruturalista manifestado por Ducrot. Para o autor, a
enunciação constitui historicamente as regularidades da língua que estão sempre
abertas ao efeito do episódio enunciativo.
Para finalizar esta primeira unidade, apresentaremos um quadro teórico,
adaptado de Indursky (op cit, p.75), que sintetiza os aspectos mais
importantes das diferentes teorias de estudos do texto e da linguagem que foram
apresentadas nesta unidade, em contraste com a linguística textual:
Linguística Textual
|
Sociolinguística
|
Pragmática
|
Semiótica Discursiva
|
Teorias da enunciação
|
Análise do Discurso
|
Unidade formal: início, meio e fim
|
Registros / recortes de fala
|
-Texto equivalente ao enunciado;
-Atos de fala
|
Objeto semiótico-linguístico e não
linguístico
|
Texto equivalente ao enunciado
|
-Unidade significativa
-Efeito-texto: completude: começo,
meio e fim
-Texto: objeto não acabado, aberto
-Relações com a Intertextualidade e
Interdiscursividade
-Objeto heterogêneo
|
Coesão e Coerência
|
Diferentes níveis de variação da/na
linguagem
|
-Atos de fala; Intencionalidade;
perfomatividade na linguagem
|
Textualização: junção do plano do
conteúdo com o plano de expressão
|
Coesão e Consistência
|
Textualização, tessitura dos recortes
e das cadeias discursivas, efeito de textualidade
|
-
|
-
|
-
|
-
|
-
|
Trabalho dos sentidos no texto
|
Internas
|
Internas e contextuais
|
Internas e contextuais
|
Internas
|
Internas e contextuais
|
-Textuais
-Contextuais
-Intertextuais
-Interdiscursivas
|
Linguístico
(cotexto)
|
|
|
Linguístico
|
Situacional (aqui/agora)
|
Sócio-histórico
|
Autor / Leitor
|
Falante / Ouvinte
|
Falante/Ouvinte;
Interacionalidade;
Cooperatividade
|
Sujeito do discurso: representação da
instância do sujeito do discurso: actantes
|
Locutor / Interlocutor
|
-Posição-sujeito inscrita numa
Formação Discursiva (Sujeito atravessado pelo inconsciente e interpelado pela
ideologia)
-Funções enunciativas do sujeito:
função-autor; efeito-autor; autoria
|
Sentido dado pelo texto
|
Sentido dado pela situação
linguística e social
|
Sentido dado pela situação
linguística e interacional
|
Construção do percurso gerativo dos
sentidos
|
Sentido construído pelos
interlocutores
|
Sentido intervalar: efeito de sentido
entre o sujeito-autor e o sujeito-leitor mediado pelo texto
|
Texto/Discurso: equivalentes
|
Texto/Discurso: equivalentes
|
Texto/Discurso: equivalentes
|
-Texto / Discurso equivalentes;
-Texto: representação semântica do
discurso
-Uma unidade que deve ser manifestada
por alguma semiótica
|
Texto / Enunciado / Discurso:
equivalentes
|
Texto: a materialidade do discurso
|
Conteúdo Complementar 5
Diferenças
e Características da Fala e da Escrita: diferentes níveis de formalidade,
organização e variação.
A Fala e a Escrita são duas modalidades de uso da língua que se utilizam
do mesmo sistema lingüístico, mas têm suas próprias peculiaridades. Isso não
significa que devam ser encaradas de maneira dicotômica (oposta, sendo uma
superior e outra inferior).
èKoch
& Oesterreicher indicam o uso do critério “medium” e do critério
proximidade/distância.
|
èChafe
considera o nível maior ou menor de envolvimento dos interlocutores.
|
èHalliday
sugere que o texto escrito tem maior densidade lexical, e o falado maior
complexidade sintática.
|
èKoch
Os textos escritos podem estar mais próximos do pólo conversacional e
vice-versa. Há ainda os tipos mistos e intermediários.
|
Conforme sintetiza Koch (1997b), vários estudiosos desta área como
Marcuschi (1995), Koch & Oesterreicher (1990), Halliday (1985) e Koch
(1992), afirmam que “os diversos tipos de práticas sociais de produção textual
situam-se ao longo de um “continuum” tipológico, em cujas extremidades
estariam, de um lado, a escrita formal e, do outro, a conversação espontânea,
coloquial” (KOCH, 1997, p.31).
Marcuschi deixa bem clara a natureza desse
“continuum” tipológico: “as diferenças entre fala e escrita se dão dentro do
“continuum” tipológico das práticas sociais de produção textual e não na
relação dicotômica de dois pólos opostos ... O “continuum” tipológico distingue
e correlaciona os textos de cada modalidade quanto às estratégias de formulação
textual que determinam o “continuum” das características que distinguem as
variações das estruturas, seleções lexicais etc. Tanto a fala como a escrita se
dão num “continuum” de variações, surgindo daí semelhanças e diferenças ao
longo de dois contínuos sobrepostos”. (MARCUSCHI, 1995, p.14).:
Para proceder a localização dos diversos tipos de texto no “continuum”,
Koch relata a contribuição de alguns autores:
Conforme
Koch, (1997b), alguns autores (Chafe, Tannen, Halliday, Oesterreicher etc.) a
partir da década de 60 consideraram a dicotomia entre as modalidades FALA e
ESCRITA, atribuindo a cada uma características particulares. Koch afirma que tais características
refletiam uma visão preconceituosa e centrada no modelo da escrita formal
padrão. Com base em tal dicotomia FALA X ESCRITA, categorizava-se que (cf.
KOCH, op.cit., p.32):
FALA
|
ESCRITA
|
Contextualizada
|
Descontextualizada
|
Implícita
|
Explícita
|
Redundante
|
Condensada
|
Não-planejada
|
Planejada
|
Predominância do “modus pragmático”
|
Predominância do “modus sintático”
|
Fragmentada
|
Não-fragmentada
|
Incompleta
|
Completa
|
Pouco elaborada
|
Elaborada
|
Pouca densidade informacional
|
Densidade informacional
|
Predominância de frases curtas, simples e coordenadas.
|
Predominância de frases complexas e subordinadas
|
Pequena freqüência de passivas
|
Emprego freqüente de passivas
|
Poucas nominalizações
|
Abundância em nominalizações
|
Menor densidade lexical
|
Maior densidade lexical
|
Em
linhas gerais, é possível considerar que essas características não são
exclusivas nem de uma nem de outra modalidade e que elas foram estabelecidas a
partir dos parâmetros da escrita por visão preconceituosa que discriminava a fala. É mister entender
que a fala possui
características próprias:
1) Devido a sua interacionabilidade intrínseca, ela é, a priori,
“não-planejável”. Ela precisa ser apenas “localmente planejável”.
|
2) Verbalização e planejamento concomitantes, pois esses
processos emergem no momento da interação – ela é o seu próprio rascunho.
|
3) Descontinuidades freqüentes no fluxo discursivo.
|
4) Sintaxe
característica ligada, de certa forma, à sintaxe geral da língua.
|
5) Fala é processo,
portanto, é dinâmica.
|
Na
atividade de “co-produção” discursiva, os interlocutores empenham-se juntos na
produção textual. Em função da interação imediata, há pressões de natureza
pragmática que passam por cima das exigências sintáticas: truncamentos,
correções, inserções, repetições e parágrafos. Esses elementos têm uma função
importante, a função cognitivo-interacional (cf. MARCUSCHI, 1986, apud KOCH,
op.cit.).
O
texto falado não é caótico, ele tem uma estrutura própria que se pauta a partir
de sua produção. É nesse sentido que deve ser descrito e avaliado. No processo
de produção do texto falado, os interlocutores estão in praesentia – num mesmo tempo e espaço físico (salvo
exceções como telefone, rádio e outras possibilidades de conversação oral à
distância que a tecnologia oferece).
Descritas as diferenças e características que
perfilam as duas modalidades, vejam-se a seguir as principais interferências da
oralidade na escrita, conforme aponta Koch em um texto intitulado "Interferências
da oralidade na aquisição da escrita", publicado na revista Trabalhos
em Lingüística Aplicada em
1997 pela UNICAMP.
I. QUESTÃO DE
REFERÊNCIA: na oralidade muitas vezes os
referentes são recuperados no próprio contexto (basta apontar, por exemplo),
dispensando assim que os falantes precisem explicitá-os sempre. Mas na escrita
não é bem assim, pois por ser não-presencial há a necessidade de explicitar
sempre os referentes, através das marcas lingüísticas. O trecho abaixo revela a
produção escrita de um sujeito que ainda não consegue diferenciar bem os usos
da situação oral dos da escrita.
II. REPETIÇÕES: no texto falado, a repetição é muito
freqüente, aliás ela é um dos seus mecanismos de organização, desempenhando
funções didáticas, sintáticas, argumentativas, enfáticas etc. O trecho abaixo
revela a interferência clara de um recurso da fala na escrita.
III. USO DE
ORGANIZADORES TEXTUAIS: são continuadores tópicos da fala, por exemplo: e, aí, daí, então,
daí então etc: Os textos das crianças são ricos em organizadores textuais
típicos da oralidade.
IV. JUSTAPOSIÇÃO DE
ENUNCIADOS SEM MARCA DE CONEXÃO EXPLÍCITA: é comum, nos textos, enunciados justapostos, sem elementos
explícitos de conexão, ligação ou transição. O sujeito que está adquirindo a
modalidade escrita, ainda não aprendeu os mecanismos seqüenciadores próprios
dessa modalidade e mistura à escrita o padrão oral.
V. DISCURSO CITADO: o discurso citado é manifestado prioritariamente no estilo direto
que o mais freqüente na oralidade, em geral, sem a presença de um verbo que
introduza a fala do outro (fulana disse:, fulana resmungou:, fulana gritou:). O
sujeito ainda não aprendeu os mecanismos seqüenciadores próprios da modalidade
escrita e mistura a ela a estrutura mais típica da oral que é a que ele melhor
conhece.
VI. SEGMENTAÇÃO GRÁFICA: também é comum que a segmentação gráfica, em textos de sujeitos
iniciantes na modalidade escrita, seja feita em função do que ele ouve. É
curioso notar que a criança, por vezes, tentando acertar a segmentação gráfica
adequada, acaba dividindo no meio algumas palavras ou juntando outras numa só!
VII. GRAFIA
CORRESPONDENTE À PALAVRA: ou seqüência de palavras tal como pronunciadas oralmente, isto é,
reproduzindo o que a criança ouve.
VIII- CORREÇÕES
FEITAS DA FORMA COMO SE FAZEM NO TEXTO ORAL: assim como na fala, o sujeito não apaga ou risca a forma que
considera inadequada, mas justapõe a esta a forma corrigida.
Mais algumas considerações teóricas sobre o
binômio oralidade e escrita
I. Fala x escrita - a perspectiva das
dicotomias: esta visão é da perspectiva dicotômica entre
fala x escrita, é considerada restrita, pois polariza essas duas modalidades da
língua. Por outro lado, há quem considere nesta perspectiva as relações fala x
escrita dentro de um “continuum”. Aqui as análises são voltadas para o código
com permanência no fato linguístico. Esta teoria deu origem ao prescritivismo
gramatical e à norma linguística. De modo geral, as características próprias à fala e à
escrita são descritas/prescritas por essa visão da seguinte maneira:
èFALA = contextual, implícita, redundante,
não planejada, imprecisa, não normatizada.
èESCRITA = descontextualizada, explícita,
condensada, planejada, precisa, normatizada.
II. Oralidade x letramento ou fala x escrita? – há que se observar algumas especificidades
dessas categorias teóricas, pois tais especificidades relacionam-se ao seu
emprego em teoria e análise. O binômio Oralidade x Letramento está voltado para
analisar as diferenças entre duas “práticas sociais”; enquanto que o binômio Fala x Escrita volta-se às
diferenças entre duas modalidades de uso da língua.
Resumindo:
èORALIDADE: prática social apresentada sob várias
formas ou gêneros textuais em sua diversidade de uso formal e contextual.
|
èFALA: forma de
produção discursivo-textual oral que dispensa um aparato técnico,
necessitando, apenas, dos recursos próprios ao ser humano.
|
èLETRAMENTO: uso social da escrita que vai de uma
apropriação mínima da escrita até uma utilização científica dela.
|
èESCRITA: tecnologia
de representação abstrata da fala e produção discursivo-textual com
especificidades próprias.
|
III. Oralidade e escrita no contexto das
práticas sociais: Marcuschi (2007a) situa o papel das práticas
sociais da escrita e da oralidade na civilização contemporânea. Ele considera a
relação entre “vida cotidiana” e os fenômenos da fala e escrita. O texto seria,
então, uma prática social e não
um artefato linguístico.
A escrita, enquanto prática social, tornar-se-ia
indispensável. Em relação ao uso da língua (fala e escrita) as práticas sociais
têm o seu lugar, papel e grau de relevância de ambas as modalidades na
sociedade – eixo de um “continuum” sócio-histórico-tipológico e até
morfológico.
[ATENÇÃO]
Para fixar:
èHOMEM = naturalmente um “ser que fala” e não um “ser que escreve” – a
escrita é derivada e a fala é primária.
èFALA = prática social do dia-a-dia.
èESCRITA = prática de um ambiente formal - escola (o que lhe confere
prestígio).
A escrita permeia hoje praticamente todas as práticas
sociais das comunidades em que se insere sob a forma de “letramento”. Os
objetivos e ênfase do uso da escrita variam de acordo com os contextos em que
se inserem: a “apropriação / distribuição” da escrita e da leitura (padrões de
alfabetização), e os “usos / papéis” da escrita e da leitura (processos de
letramento). Mesmo as pessoas analfabetas também estão sob a influência das
estratégias da escrita em seu desempenho oral.
A escrita passou a ter um “status” bastante singular no contexto
das atividades cognitivas em geral. Deve-se distinguir, então:
·LETRAMENTO: processo de aprendizagem
sócio-histórica da leitura e da escrita em contextos informais e para usos
utilitários.
·ALFABETIZAÇÃO: domínio ativo e
sistemático das habilidades de ler e escrever.
·ESCOLARIZAÇÃO: prática formal e
institucional de ensino que visa a uma formação do indivíduo, sendo que a
alfabetização é apenas uma das atribuições/atividades. (cf MARCUSCHI, 2007a).
A escrita é uma fonte de preconceito, na
medida em que se atribui o desenvolvimento à alfabetização. A escrita é um fato histórico e deve ser tratado como tal
e não como um bem cultural. (cf MARCUSCHI, 2007a)
A história do uso da escrita e da alfabetização ocidental
é descontínua e contraditória (relação alfabetização/processo de
industrialização). A alfabetização instituída dá-se de preferência sob o
controle do estado, orientando-se por seus objetivos. Assim a aquisição da
escrita é um fenômeno “ideológizavel”. A fala é contínua no dia-a-dia e a oralidade
tem lugar em seus diferentes contextos e usos sociais.
IV. Oralidade x escrita: a tendência
fenomenológica de caráter culturalista: esta visão é aculturalista e de perspectiva
epistemológica. Ela observa as práticas sociais da oralidade x escrita, faz
análise cognitiva dos efeitos de organização e produção do conhecimento no
aspecto psico-sócio-econômico-cultural. Esta tendência é inadequada para o
trato com os fatos da língua. Ela confere ao domínio da escrita o avanço na
capacidade cognitiva-individual:
X
|
èCultura
oral
|
èCultura
escrita
|
Pensamento
concreto
|
Pensamento
abstrato
|
Raciocínio
indutivo
|
Raciocínio
dedutivo
|
Atividade
artesanal
|
Atividade
tecnológica
|
Cultivo da
tradição
|
Inovação
constante
|
Ritualismo
|
Analitismo
|
Há três grandes problemas nessa tendência:
·Etnocentrismo;
·Supervalorização da escrita; e
·Tratamento globalizante.
V. Fala x escrita – perspectiva
variacionista: tal visão trata do papel da escrita a partir
dos processos educacionais e da variação na relação língua padrão e não-padrão
em contextos de ensino formal. Modelos teóricos baseiam-se no “currículo
bidialetal”. Não há dicotomias, verificam-se as regularidades e variações:
Língua padrão è
|
á Variedade não-padrão
|
Língua culta è
|
á Língua coloquial
|
Norma padrão è
|
á Norma não-padrão
|
Marcuschi (2007)
afirma simpatizar com essa tendência, mas acredita serem necessárias maiores
reflexões. Para ele fala e escrita não são dialetos, mas “modalidades” de uso
de língua. Nesse sentido o aluno se tornaria “bimodal”.
VI. Oralidade x escrita – a perspectiva
interacional: esta perspectiva trata das relações entre
fala e escrita, considerando o “continuum” textual. É a visão interacionista,
cujos fundamentos baseiam-se em:
·Relação dialógica no uso
·Estratégias de linguagem
·Funções interacionistas
·Envolvimento e situacionalidade
·Formulaicidade
Este modelo percebe mais sistematicamente a língua enquanto
fenômeno dinâmico e estereotipado, centrando-se em atividades dialógicas que
frisam os aspectos mais salientes da fala. Porém tem um baixo potencial explicativo e
descritivo dos fenômenos sintáticos e fonológicos da língua (cf Marcuschi, 2007a).
VII. Concepção e funcionamento da língua –
consequente relação fala / escrita: O sucesso da análise vai depender da
concepção de Língua que subjaz à teoria, bem como da noção de funcionamento da
língua, esta é fruto das condições de produção. A noção de sistema atém-se à
concepção básica de uma “estrutura virtual”. Fica desde já eliminada uma série
de distinções geralmente feitas entre fala e escrita, tais como a
contextualização (na fala) X descontextualização (na escrita), implicitude (na fala) X
explicitude (na escrita) e assim por diante.
A língua (seja oral ou escrita) reflete a organização da
sociedade, uma vez que se
relaciona com as “representações e as formações sociais”. Entretanto, a fala e
a escrita representam formas de
organização da mente através das próprias representações mentais. Vale
salientar, sobretudo, que, assim como a fala não apresenta propriedades
intrínsecas negativas, também a escrita não tem propriedades intrinsecamente
privilegiadas. São modos de representação cognitiva e social que se revelam em
práticas sócio-culturais específicas. A
oralidade e a escrita são ambas práticas sociais e não propriedades de
sociedades distintas.
Conteúdo 6 - Considerações sobre
a Análise da Conversação
Esta área tem um caráter interdisciplinar, na medida em que divide
alguns pressupostos teóricos com outras áreas (inclusive com a LT). Ela busca
estabelecer relações com a exterioridade da linguagem, problematizando a
separação entre a materialidade da língua e seus contextos de produção. Assim
como a Sociolinguística, a Pragmática, a Análise do discurso, a Semiótica
discursiva e a própria Linguística textual, esta área também mobiliza saberes
de outras ciências como a Filosófica da linguagem, a Antropologia, a História,
a Sociologia, a psicanálise e as Ciências cognitivas.
Foi na década de 1980 que foi lançado, no Brasil, o primeiro livro nesta
área com o título “Análise da Conversação”, de Luiz Antônio
Marcuschi (1986/2007b). Para este autor, a conversação é o exercício prático
das potencialidades cognitivas do ser humano em suas relações interpessoais,
tornando-se assim um dos melhores testes para a organização e funcionamento da
cognição na complexa atividade da comunicação humana.
Como enfatiza Marcuschi (2007b), a Análise da Conversação (doravante AC)
teve origem na década de 1960 no campo dos estudos sociológicos ligados à
Etnometodologia a partir de trabalhos referenciais como os de Harold Garfinkel,
Harvey Sacs, Emanuel Schegloff e Gail Jeferson. A partir dessa perspectiva, os
estudiosos da AC têm procurado investigar os aspectos da organização do texto
conversacional.
Vejamos três níveis essenciais desse enfoque apontados por Hilgert (1989
apud MARCUSCHI, 2007b):
A) macronível: nas fases conversacionais – abertura, fechamento e parte central,
e o tema central e subtemas da conversação.
B) nível médio: turno conversacional, tomada de turnos,
sequência conversacional, atos de fala e marcadores conversacionais.
C) micronível: elementos internos do ato de fala, que constituem sua estrutura
sintática, lexical, fonológica e prosódica.
A Análise da Conversação estabelece o texto como seu objeto de estudos,
mas esta área vai dedicar-se único e exclusivamente ao estudo do texto oral,
natural, e presencial (face to face), ou seja, aquele texto produzido em
situações espontâneas. Portanto, textos “artificiais” como os de novela, cinema
ou ainda conversas telefônicas, não são objeto de interesse específico neste
campo científico.
Numa conversa, geralmente abordada-se um ou mais tópicos discursivos,
algo sobre o que duas pessoas (pelo menos) conversam. Esse tópico
discursivo define-se como uma atividade que correlaciona objetivos
entre os interlocutores onde há um movimento dinâmico da estrutura
conversacional que faz dele a base do texto oral. A organização tópica, como já
foi anteriormente retomada de Fávero, pauta-se em três propriedade: a
centração, organicidade e delimitação.
Na Análise da Conversação, o tópico discursivo (aquilo sobre o que se
fala) é fio condutor da conversação e a unidade funcional da conversação é
o turno (período de tempo que cada falante ocupa).
Para sinalizar que compartilhamos cognitivamente da interação,
recorremos, naturalmente, a expressões do tipo: “isso me lembra”, “por falar
em” etc. que podem marcar a passagem de um tópico a outro. A estrutura tópica
serve, assim, de fio condutor da organização linear do discurso. Conforme
Dionísio, 2001
Lembre-se de que o planejamento na fala ocorre no momento da interação,
pois a conversação é localmente planejada. Considere ainda que em se
estabelecendo uma gradação do informal para o formal, observa-se uma variedade
entre esses dois pólos que se estabelecem dentro de um continuum e
que podem ser exemplificadas relacionando diferentes variedades entre fala e
escrita, escrita e escrita, e fala e fala, conforme já foi refletido a partir
das contribuições de Marcuschi nesse assunto.
Após esta apresentação da AC, acompanhe a seguir alguns dos pontos mais
importantes dessa teoria linguística.
I. SOBRE O TRATAMENTO DOS DADOS ORAIS – primeiramente,
deve-se considerar o sistema de transcrição de texto oral: as conversações
naturais que servem decorpus para a AC devem ser gravadas ou
filmadas para que o analista possa observar, transcrever e comprovar seuS dados
da maneira mais fiel possível. O analista pode privilegiar os aspectos
fundamentais para sua análise, mas a transcrição deve ser legível. Em função do
trabalho com textos orais, esta área possui normas de transcrição de texto
bastante específicas para atender a todas as situações. A AC analisa materiais
empíricos, orais, contextuais, incluindo realizações entonacionais e gestuais
que possam colaborar com a construção do sentido. Um outro aspecto importante
para caracterizar o perfil da Análise da Conversação é a importância conferida
também aos recursos não verbais utilizados na fala.
No segundo capítulo do livro Análise da Conversação,
Marcuschi (2007b) apresenta um sistema de transcrição para textos falados, que
sintetiza bem como deve ser o tratamento formal de transcrição da fala e que
inclusive serve de base às transcrições do Projeto NURC. Segue abaixo o
referido quadro adaptado:
OCORRÊNCIAS
|
SINAIS
|
EXEMPLIFICAÇÃO
|
1. Indicação dos falantes
|
Os falantes devem ser indicados em linha, com letras ou alguma
sigla convencional
|
H28
M33
Doc.
Inf.
|
2. Pausas
|
...
|
não... isso é besteira
|
3. Ênfase
|
MAIÚSCULA
|
ela comprou um OSSO
|
4. Alongamento de vogal
|
: (pequeno)
:: (médio)
::: (grande)
|
eu não tô querendo é dizer
que ... é: o eu fico até:: o: tempo
todo
|
5. Silabação
|
-
|
do-minadora
|
6. Interrogação
|
?
|
ela é contra a mulher
machista... sabia?
|
7. Segmentos incompreensíveis
ou ininteligíveis
|
( )
(ininteligível)
|
bora gente... tenho aula... ( ) daqui
|
8. Truncamento de palavras ou desvio sintático
|
/
|
eu pre/ pretendo comprar
|
9. Comentário do transcritor
|
(( ))
|
M.H. ... é ((rindo))
|
10. Citações
|
“”
|
“mai Jandira eu vô dize a
Anja agora que ela vai
apanhá a profissão de
madrinha agora mermo”
|
11. Superposição de vozes
|
[
|
H28. é... existe... [você ( )do homem...
M33.
[pera aí... você
Acha... pera aí... pera aí
|
12. Simultaneidade de vozes
|
[[
|
M33. [[mas eu garanto que muita coisa
H28. [[eu acho eu acho é a autoridade
|
13. Ortografia
|
|
tô,ta, vô, ahã, mhm
|
II. A ORGANIZAÇÃO DA CONVERSA – numa conversa, os interlocutores
devem falar um por vez. Eles devem esperar um lugar relevante para a
transição (LRT), ou seja, esperar por marcas na fala do interlocutor
como pausas, hesitações, entonações descendentes, marcadores etc. Os
interlocutores emitem sinais para marcar o fim de seu turno ou um convite à
fala do outro e trocam o tempo todo os papéis de falante e ouvinte, mas isso
não impede que, em algumas situações, muitas pessoas falem ao mesmo tempo e se
entendem. Todos os falantes têm direito à fala. Conforme explica Marcuschi
(2007b), a noção de turno engloba dois sentidos:
Os turnos podem ser nucleares (centrais no
desenvolvimento do tópico discursivo) e inseridos (produções
marginais ao tópico). A mudança de turno pode ocorrer através da passagem,
assalto, e sustentação da fala. A passagem do turno pode ser requerida ou
consentida pelo falante; os assaltos são uma espécie de violação da regra
“falar um de cada vez” e o falante invade o turno do outro sem solicitação ou
consentimento (o interlocutor assaltado pode perder e em seguida retomar,
abandonar ou recuperar o comando da interação sobrepondo-se à fala do outro); e
a sustentação é uma tentativa do falante de garantir a posse do turno,
recorrendo a marcadores conversacionais, alongamentos, repetições e elevação da
voz.
No caso das entrevistas formais, que apresentam uma estrutura básica
de pergunta e resposta, em geral, a elaboração do turno
conversacional apresenta uma distinção nítida: os turnos de resposta tendem a
ser longos e apesar de pausas, truncamentos, hesitações, alongamentos etc, não
há tomada de turno. A estrutura em pergunta e resposta compõe a unidade
fundamental da organização conversacional e podem variar na sua realização.
III. DOS MARCADORES CONVERSACIONAIS – como o texto oral é
planejado e verbalizado ao mesmo tempo, dos recursos mais característicos da
fala natural são os marcadores conversacionais que podem ser verbais,
não-verbais ou prosódicos: alguns marcam finalização de turno (“não
é?”, “entendeu?”); outros marcam participação (“uhrum”); e outros marcam
convergência (“exato”, “sim”). Os marcadores conversacionais são produzidos
pelos falantes para dar tempo à organização do pensamento, sustentar o turno,
monitorar o ouvinte, corrigir-se, reorganizar e reorientar o discurso, e pelos
ouvintes para orientar e monitorar o falante quanto à recepção com sinais de convergência,
indagação e divergência.
IV. A CONSTRUÇÃO DA COMPREENSÃO NO TEXTO FALADO – quando dois ou
mais indivíduos conversam, eles coordenam conteúdos e ações, contruindo um
texto coerente. O sucesso da interação atrela-se ao processo interacional
estabelecido entre os participantes num esforço coletivo pela construção de
sentidos. Conforme Marcuschi (op cit), a compreensão na interação verbal face a
face, resulta de um projeto conjunto de interlocutores em atividades
cooperativas e coordenadas de co-produção de sentido e não de uma simples
interpretação semântica de enunciados postos. O analista deve dar conta de como
os participantes de uma interação resolvem suas estratégias e processos de
compreensão. Marcuschi apresenta algumas atividades de compreensão na interação
verbal que merecem destaque:
·Estratégia 1- negociação: central para a produção de sentidos na
interação verbal dada a sua natureza conjunta;
·Estratégia 2- construção de um foco comum: na interação a base da troca é a
sintonia referencial, o interesse comum e referentes partilhados;
·Estratégia 3- demonstração de (des)interesse e (não-)partilhamento: se não há
esse partilhamento a interação não progride;
·Estratégia 4- existência e diversidade de expectativas: os
interlocutores criam expectativas diversas em relação um ao outro relacionadas
ao contexto, às condições em que são produzidas, conhecimento partilhado etc;
·Estratégia 5- marcas de atenção: sinais enviados pelos
interlocutores que demonstram se há boa ou má sincronia na interação.
A análise da conversação no Brasil constitui-se em uma linha de pesquisa
praticada sistematicamente com uma produção editorial que abrange transcrições
de materiais do corpus do Projeto de Estudo da Norma Linguística Urbana Culta
(NURC), análises de textos orais sobre diversos temas da AC, gramáticas do
português falado (com o corpus dos NURCs), além de teses e dissertações
defendidas nos programas de pós-graduação das universidades brasileiras.
Conteúdo 7 - Leitura, oralidade e escrita: práticas linguísticas,
sociais e pedagógicas
Historicamente, as práticas de Escrita e Leitura se configuraram
como representações sócio-discursivas de diferentes classes e aquelas práticas
relacionadas às classes econômico e politicamente dominantes foram atreladas ao
“bom uso” do vernáculo, à aquisição e acúmulo do conhecimento (e
sua organização), ao progresso e avanço científico-tecnológico e à ascensão
social. Nessa perspectiva, vinculou-se à escola, sobretudo, o papel de
“ensinar”, reproduzir e reconhecer tais práticas.
A prática pedagógica faz uso de cartilhas, livros e manuais
didáticos para instrumentalizar os exercícios de leitura e escrita em sala de
aula. Entretanto, a escola mostra modelos de escrita, mas não consegue
ensiná-los. A escola não prioriza: Quais são as condições atuais de leitura?
Quem lê? Quem escreve? Para quê? Por quê?
No exercício pedagógico das práticas de Leitura e Escrita há o
apagamento (ou enfraquecimento) de sua mais importante característica: a
interacionalidade dialógica – constitutiva da linguagem, seja oral ou escrita.
A escola se faz o grande (e único) interlocutor do aluno. Desde os exercícios
de reconhecimento fonético “IVo Viu a uVa”, até as tais “fichas
de leitura” em que os alunos nem precisam ler o livro para completar
as respostas. (cf. GERALDI, 1985).
O aluno não é levado a produzir textos
e sim a reproduzi-los e sua autonomia e originalidade, na maioria das vezes, é
podada e minada ao longo de seu percurso escolar. Portanto, não há troca,
interação, mas apenas uma simulação desse processo entre professor e aluno. Em
geral, o professor é sempre a boca (falante) e o aluno é sempre a orelha
(ouvinte), sem que nunca troquem de papéis. E quando o aluno (re)produz, o professor
não está interessado em sua produção, mas em se ele conseguiu reproduzir o
modelo.
Os sentidos que as crianças atribuem à escrita, seus esquemas de
interpretação, são variados e dependem das experiências passadas, bem como dos
conhecimentos adquiridos – a escola confunde falta de conhecimento com
inaptidão para adquirir os conhecimentos acadêmicos, não reconhecendo o saber
do aluno e rotulando-os: “os alunos fracos”, “os que não sabem”. Veja-se o
texto, abaixo, em que a professora está interessada em se a criança decodificou
a escrita, mas não está preocupada com a interpretação que a criança faz.
Apresentado por SMOLKA (1988, p.59).
A
professora escreve na lousa:
"A mamãe afia a faca"
e pede para uma criança ler.
A criança lê corretamente.
Um adulto pergunta à criança:
- Quem que é a mamãe?
- É a minha mãe, né?
- E o que que é "afia"?
A criança hesita, pensa e responde:
- Sou eu, porque ela (a mamãe) diz: vem cá, minha fia.
A professora, desconcertada, intervém:
- Não, afia é amola a faca!"
|
A criança é exposta a uma frase solta, descontextualizada, mas mesmo assim
tenta levantar hipóteses, com base no uso que ela faz de ‘afia’ no seu
contexto social e funcional. Vê-se que, como a criança já usa a linguagem
(oral) e sabe que ela tem uma função, um sentido, ela fica confusa por não
conseguir se subjetivar pelo “texto” que a escola apresenta.
Sobre a questão da oralidade na escola, Brito (1985) postula que “O
processo de construção de redação é uma disputa (não uma integração) constante
entre a competência lingüística do estudante (basicamente oral, não-formal e
desescolarizada) e a imagem de língua escrita que cria a partir da imagem do
interlocutor e de interlocuções privilegiadas (...) Como esse interlocutor tem
caráter fortemente repressivo e valorativo, o estudante, na necessidade de
mostrar que “sabe”: - nega sua capacidade lingüística oral; cria uma imagem de
língua a partir das fontes que identifica com a imagem do interlocutor, isto é,
relações sociais em que haja (ou o aluno identifique) marcas de autoridade,
padrão culto etc.” (BRITO, 1985, p.125).
Geraldi (1985) conclui que, nessas condições, quanto menos
conhecimento específico sobre a linguagem escrita (metalingüístico) a criança
tem, mais noção da funcionalidade escrita ela demonstra.
Ele aponta o exemplo de dois garotos que foram reprovados em um ano por
“não saberem escrever” e no ano seguinte um foi aprovado e o outro novamente
reprovado. Mas, conforme Geraldi, a “produção” do aluno aprovado não passava de
uma caricatura idiota, reprodutora do modelo das cartilhas, que nem chega a ser
um texto (e sim, no máximo uma “redação”). Já o aluno reprovado, apesar de
vários problemas com o registro escrito, apresenta verdadeiramente um texto,
uma narrativa em que se pode compreender uma história com todos os seus
elementos básicos (enredo, personagens, espaço, tempo, clímax) e, além disso, o
texto denota a subjetividade de seu autor, pois retrata um tema bastante típico
paras as crianças, sobretudo as de classe econômica baixa.
Textos apresentados por GERALDI (1985, p.129).
A casa
é bonita.
A casa é do menino.
A casa é do pai.
A casa tem uma sala.
A casa é amarela.
|
Era uma
vez umpionho queroia ocabelo dai um emninopinheto dapasou um umenino lipo
enei pionho aí pasou um emnino pionheto daí omenino pegoupionho da amunhér
pegoupionho da todomundosaiogritãdo todomundo pegou pionho di até sofinho
begoupionho.
|
è [Era
uma vez um piolho que roía o cabelo de um menino piolhento daí passou um
menino limpo sem piolho aí um menino piolhento daí o menino pegou piolho daí
a mulher pegou piolho daí todo mundo saiu gritando todo mundo pegou piolho
até seu filhinho pegou piolho.]
|
èSmolka (1988) questiona: “que escrita é essa que a criança
aprende na escola que faz com que ela “regrida” quando escreve o que pensa?
Assim se comprova, mais uma vez, que a escola ensina as crianças a repetirem
e reproduzirem palavras e frases feitas. A escola ensina palavras isoladas e
frases sem sentido e não trabalha com as crianças [na fase da escrita
inicial], o “fluir do significado”, a estruturação deliberada do discurso
interior pela escritura” (SMOLKA, 1988,
p.69).
|
É devolvendo o direito à palavra ao aluno que talvez se possa um dia ler
a história contada, e não contida, da grande maioria que hoje ocupa os bancos
das escolas públicas. “E tal atitude, parece-me, dá novo significado à questão
“como avaliar redações?” apontando, no mínimo, para critérios diferentes
daqueles que reprovaram o autor do texto, e aprovaram o “autor” da
redação.” (GERALDI, 1985, p.129).
É preciso não perder de vista que o autor/sujeito emerge do discurso na
escritura, e o professor enxergará isso, observando as marcas, delineando as
pistas e trabalhando a leitura e escritura como práticas discursivas. As
situações de ensino/aprendizagem devem ser instauradoras da relação de
interação e interlocução – ela é objeto de conhecimento e constitutiva do
conhecimento na interação. Não se trata apenas de ensinar (no sentido de
transmitir) a escrita, mas de usá-la como interação e interlocução na sala de
aula, experimentando a linguagem nas suas várias possibilidades.
Veja-se a seguir uma importante sugestão de Smolka (1988), nesse
sentido:
è “Buscando,
então, transformar algumas condições e procedimentos de ensino nas escolas,
começamos a usar, como uma das formas de articulação das atividades e de
constituição da interdiscursividade, a literatura infantil. Além da
literatura, procurávamos implementar as várias formas de linguagem (plástica,
corporal etc) possíveis e viáveis nas situações escolares. E por que a
utilização da literatura? Porque a literatura, como discurso escrito, revela,
registra e trabalha formas e normas do discurso social; ao mesmo tempo,
instaura e amplia o espaço interdiscursivo, na medida em que inclui outros
interlocutores – de outros lugares, de outros tempos – criando novas
condições e novas possibilidades de troca de saberes, convocando os
ouvintes/leitores a participarem como protagonistas no diálogo que se
estabelece”. (SMOLKA, 1988, p.80).
|
è“Nesse
processo, a escrita integra o habitus e a possibilidade, a necessidade e o
gosto (também forjados socialmente) da interação por escrito ganham
força na correspondência e no registro das experiências. Mas relato e ficção
se fundem, se confundem: o imaginário também ganha força. Fatos e crenças,
ritos e mitos, medos e desejos são explicitados. É o discurso cotidiano que
começa a ser marcado pelo trabalho de escritura das crianças e que traz,
portanto, as marcas da realidade sócio-cultural dos indivíduos e dos grupos
em interação.” (SMOLKA, 1988, p.100).
|
Considerando a proposta da autora, vejam-se três textos (apresentados por Smolka)
em que se podem reconhecer todos esses aspectos por ela apontados, relacionados
ao trabalho com o texto literário e o processo de subjetivação da criança,
através da leitura/escrita.
CONTEUDO
8
ESTRATÉGIAS
DE LEITURA
. A leitura quanto um ato individual, uma vez que a
leitura é um ato individual na construção de significado num contexto.
Portanto, para cada leitor depende de seus conhecimentos, interesses e
objetivo.
As estratégias podem ser inferidas a partir da compreensão
verbal ou não verbal do texto.
ESTRATÉGIAS
COGNITIVAS
São operações inconscientes do leitor. De acordo com KLEIMAN , os
mecanismos cognitivos no processamento do texto: MATERIAL ESCRITO, MEMORIA DE
TRABALHO, MEMÓRIA INTERMEDIÁRIA, MEMORIA LONGO TERMO, MEMORIA SEMANTICA,
MEMORIA PROFUNDA.
ESTRATÉGIAS
METACOGNITIVAS
São varias estratégias que podem ser utilizadas pelo
leitor. Ele poderá voltar e reler o texto ou procurar por palavras-chaves,
fazer um resumo do que entendeu , procurar
exemplo de um conceito. Desenvolvendo
habilidades verbais das estratégias cognitivas.
A estratégia de leitura consiste em buscar
reproduzir condições ao leitor a
flexibilidade e independência.
CONTEUDO
9
TIPOS
DE LEITOR
As hipóteses sobre o processo subjacente á leitura , o
leitor participa reconstruindo o discurso do escritor. Temos duas hipóteses: a
ascendente; o leitor faz uma analise e identifica em partes menores o sentido
do texto.
A descendente o leitor faz uso de seus conhecimentos sobre o assunto para o entendimento do texto.
Se os processos forem usados conjuntamente, teremos um
leitor CONSTRUTOR-ANALISADOR.
Temos um LEITOR-COOPERATIVO; um ato de comunicação por
regras convencionais, sendo assim um escritor claro e um leitor com recursos
linguísticos simples
Leitor-reconstrutor define como um ato de reconstrução
dos processos de sua produção que o leitor se coloca seguindo as trilhas
deixadas pelo escritor.