A
partir da expansão das tecnologias eletrônicas de comunicação e informação, a
sociedade atual adquiriu novas maneiras de viver, de trabalhar, de se
organizar, de representar a realidade e de se fazer educação. Isso significa
dizer que as mudanças que vêm ocorrendo nos modos de produção de bens materiais
no mundo globalizado refletem em todos os setores da cultura e da
subjetividade. Numa era que se distingue pela utilização generalizada das
tecnologias, impõe-se estudar a relevância da utilização dos recursos
tecnológicos no ensino de Literatura, a fim de contribuir para a revitalização
da disciplina, acenando com a possibilidade de mudança na formação do educador
e do educando. Nesse sentido, é imprescindível promover a Literatura para que
se torne além de agradável e produtiva, uma possibilidade de reflexão sobre o
ser humano e a sociedade.
Tecnologia no sistema
de ensino
Cada dia que passa a informatização invade mais e
mais todos os espaços e atividades, sejam privados ou públicos, e não estar
preparado para ler e escrever no ciberespaço é tornar-se um analfabeto digital
e, por conseguinte, um cidadão limitado no exercício de seus direitos. Com a
possibilidade de qualquer usuário conectado à internet criar gratuitamente
contas de e-mail e páginas com seu perfil (onde podem ser disponibilizados diferentes
mídias), blogs, “canais de TV” (no YouTube) e comunidades em sites de
servidores ou de relacionamento, tal como o Orkut, além de poder postar sua
opinião sobre qualquer assunto em fóruns, blogs e sites ou até mesmo seu texto
literário em sites que funcionam como revistas eletrônicas, criou-se uma
“cultura de participação” (JENKIS apud VARGAS, 2005) e do “faça você mesmo”,
cujo fruto mais significativo talvez seja a Wikipédia. Se não considerarmos o
aspecto das vendas – e do consequente retorno financeiro ao autor – no que diz respeito
ao sistema de produção e circulação da literatura em uma sociedade capitalista,
é possível considerarmos que a internet tornou possível a qualquer pessoa
editar e divulgar seus textos sem ter que passar pela intermediação das
editoras, distribuidoras e livrarias, assim tornando-se um autor no mercado dos
bens simbólicos do campo literário. O que, é claro, não quer dizer que esse
autor vá ser (re)conhecido, pois, no mínimo, é necessário alguma estratégia de
divulgação/promoção que leve as pessoas ao seu site ou blog “a fim de que o
texto publicado não fique num túmulo internético”, conforme observa, com razão,
José Luís Jobim (2005, p. 129). Mas isso não é argumento contra o fato de a
internet abrir espaço para qualquer um publicar-se, pois o mesmo pode ocorrer
com a produção independente ou até mesmo com aquela feita por alguma editora
(re)conhecida que “carimbe o passaporte” para o campo literário – carimbo que
nem sempre é uma garantia de qualidade. As vantagens, em suma, que o meio da
web apresenta com relação às publicações impressas (sejam feitas por editoras
ou gráficas, de modo independente) podem ser resumidas nos seguintes pontos:
1. Acesso amplo à publicação – A web
disponibiliza novos espaços de publicação – sejam blogs, disponíveis
gratuitamente para o internauta (mesmo os pouco experientes), ou sites. Nesse
formato é que, em geral, se encontram as revistas literárias. Para publicar, o usuário
pode apresentar seu texto para ser avaliado pelos editores ou, após
cadastrar-se e receber uma senha para administrar o espaço que lhe é
disponibilizado, inserir por conta própria seu texto – que estará on-line em
questão de segundos, conforme a velocidade de conexão.
2. Edição de revistas com baixíssimo custo para os
editores – A criação de sites que funcionem como revistas eletrônicas tem
custos extremamente baixos, limitados à manutenção de servidor e domínio, além
da aquisição de softwares que sejam necessários ao trabalho de edição.
3. Alcance mundial de público – A publicação de
impressos (livros, revistas, etc.) necessita de distribuição, que no caso
brasileiro sempre é muito limitada. Basta lembrar que o número de livrarias e
bibliotecas no país é extremamente irrisório – para não se dizer ridículo. Em contrapartida,
publicar no ciberespaço é ter a garantia de ser lido em qualquer lugar do
planeta que tenha um computador conectado à web.
4. Interatividade autor-leitor no processo de criação
– A publicação no ciberespaço possibilita uma interação com os leitores através
do espaço de comentários, fóruns ou chats, o que não acontece quando o escritor
publica apenas pelo meio impresso. No caso da publicação de um romance em blogs
ou sites, assim como se fazia nos folhetins dos jornais nos séculos XVIII e XIX,
o autor tem a vantagem de acompanhar diretamente os comentários dos leitores e
de interagir/dialogar com eles durante o processo de escritura. Um caso
exemplar e surpreendente, além dos sites de fanfictions, é o experimento de
elaboração da comédia policial “Os anjos de Badaró”, de Mario Prata, escrita
com a colaboração dos leitores de seu site http://marioprataonline.com.br durante
seis meses.
5. Recursos multimídia – Uma revista eletrônica (assim
como um e-book) pode dispor de recursos tais como imagens em movimento, vídeos
e arquivos de som, além dos hiperlinks, o que no caso de uma publicação
impressa não acontece – salvo outras mídias lhe acompanhem como encarte, mas
isso não garante uma interação orgânica de imagens e sons com o texto, ou seja,
a incorporação dessas outras linguagens na estrutura do texto.
6. Criação de redes de afinidades entre
escritores e/ou leitores – A publicação em sites ou blogs possibilita através
de links com outras publicações ou autores afins o estabelecimento de redes, o
que favorece a divulgação do trabalho e o estabelecimento de comunidades de produtores
e leitores. Exemplos são o Portal Literal (cuja curadoria é de Heloísa Buarque
de Hollanda) e o blog As escolhas afetivas, criado pelo argentino Aníbal Crístobo,
e que propõe uma curadoria autogestionada de poesia “de forma que um autor
publique seus poemas e também mencione outros autores, que, por sua vez, farão o
mesmo” (GUADALUPE, 2008, p. 698).
É claro que há algumas desvantagens, mas são bastante
reduzidas e relativas. A mais evidente é o fato das publicações on-line serem
bastante fugazes, ou seja, a garantia de perenidade dos textos digitais é muito
menor do que aqueles impressos. Basta que o site ou o servidor desapareça para
que se perca a(s) informação(ões) nele depositada(s). Mas essa desvantagem,
quando confrontada com as inúmeras vantagens, não é tão relevante, até porque
há formas de “driblar” esse perigo (publicando em diferentes espaços ou
arquivando os textos para publicá-los novamente em outro, caso se perca o sítio
original). Além do mais, a pequena tiragem de livros (pensemos nas edições
esgotadas, o que não acontece jamais com um texto on-line) e o difícil acesso a
eles parece ser um obstáculo bem maior.
Além do mais, o uso dessas novas tecnologias aplicadas
ao ensino só pode trazer benefícios se bem fundamentado e planejado. O
ciberespaço com sua organização em rede, que permite os enlaces intra e extratextuais
que caracterizam o hipertexto, potencializa o desejo de um ensino interativo e
dialógico capaz de romper com a passividade do aluno, tornando-o um construtor
do conhecimento juntamente com o professor, que deixa de ser um simples
transmissor. É nessa perspectiva que se encontra a proposta de Maria João Gomes
(2005) quanto à utilização de blogs no ensino. Segundo ela, eles podem ser usados
como recurso ou estratégia pedagógica. Enquanto recurso, são possíveis os
seguintes usos pedagógicos dos blogs:
a) um espaço de acesso à informação
especializada, seja pelo professor ou pelo aluno;
b) um espaço para o professor disponibilizar
informações, ou seja, funciona como um livro on-line em que ele vai postando os
textos a serem estudados na classe ou fora dela.
Por outro lado, enquanto estratégia pedagógica, os
blogs podem ser utilizados como:
c) um portfólio digital, ou seja, espécie de
diário de classe do aluno (ou de um grupo de alunos) onde se registra o
“acompanhamento e a reflexão sobre as atividades e temáticas abordadas ao longo
das aulas” (GOMES, 2005, p. 314);
d) um espaço de intercâmbio e colaboração em que alunos
e professores de diferentes escolas, muitas vezes em regiões isoladas, possam
interagir em torno de um projeto ou problema comum;
e) um espaço de debate e simulação de debate (excelente
para aulas de produção de textos ou debate de ideias);
f) um espaço de integração, possibilitando ao
aluno afastado da escola ou da sala de aula acompanhar os conteúdos estudados e
interagir com o professor e a classe.
A diferença entre usar os blogs como recurso ou estratégia
é uma função da relação que se estabelece entre o professor e os alunos no
processo de ensino e aprendizagem. No primeiro caso, o seu uso privilegia o
pólo do professor no papel ativo de produzir e postar os conteúdos, cabendo aos
alunos lê-los e, no máximo, comentá-los; no segundo, privilegia o pólo dos
alunos, a quem cabe a tarefa de produzir os textos e postá-los para comentários
e orientações do professor. Nesse caso, o professor incentiva os alunos para
que sejam os responsáveis por todo o processo de construção do conhecimento,
que abrange a pesquisa, a seleção, a reorganização e a síntese das informações
a serem postadas. Entre os dois pólos, há muitas combinações possíveis, entre
as quais acrescentaria o de criar-se um blog para uso comum do professor e dos
alunos, todos se responsabilizando pelo trabalho de pesquisa, seleção, organização
e produção de postagens em torno de temas estabelecidos em comum acordo. Desenvolver
o ensino de redação e a produção textual no ciberespaço torna-se muito mais
dinâmico e produtivo graças a sua estrutura.
Além dos blogs, dois outros importantes recursos a
serem explorados – especialmente para a realização de oficinas on-line – são os
chats e fóruns. O primeiro, especialmente, tem a vantagem de permitir a
interação simultânea entre os participantes e o coordenador da oficina, que
podem se encontrar em uma sala de bate-papo para discutir e refletir na
velocidade dos cliques sobre os textos previamente produzidos. Sem a mesma
velocidade de interação, os fóruns podem exercer a mesma função com a vantagem
do maior tempo para reflexão resultante entre uma e outra postagem. Um ótimo
exemplo de como o uso do fórum pode ser profícuo são os sites de fanfics, em
que os aficcionados produzem seus textos narrativos sendo orientados e
criticados por colegas colaboradores que tem essa função na organização destas
comunidades.